Ressentimento doentio
Joanna de Ângelis
A queixa contumaz procede, na sua essência, das fixações ecoicas que predominam no comportamento do ser humano.
Quando o ego deseja fortalecer-se trabalha para chamar a atenção dos circunstantes, muitas vezes de maneira agressiva, revitalizando-se com a energia que lhe é direcionada.
Hábil, na dissimulação, oculta-se em condutas especiais que disfarçam as suas intenções de predomínio.
Nesse sentido, apresenta-se relativo, reclamando de tudo e de todos, de forma que os louros do bem e do bom exornem-no, exibindo-se como modelo digno de louvor e de comentários.
Em face desse comportamento, acumula toxinas emocionais nas paisagens íntimas, avançando para a manutenção do ressentimento.
Ressentir constitui uma forma de chamar a atenção dos outros em torno da sua morbidade. O egoísta sente necessidade de reviver, de reexperimentar as emoções perturbadoras das situações, mesmo as desagradáveis que lhe são impostas pelas circunstâncias, dessa maneira vestindo-se de vítima, que deve ser homenageada pela sua infelicidade...
À medida, porém, que o ressentimento acumula resíduos psicológicos de amargura, transforma-se em rancor.
Nessa fase, a quebreira se instala e o resultado nefasto surge, atingindo aquele que se permitiu derrapar no engodo personalista.
O ressentimento é estágio de censura contra a conduta do próximo, apontando-lhe os desvarios e os erros que, em hipótese última, trata-se da projeção dos próprios conflitos.
Não tendo coragem de proceder a uma autoanálise libertadora, muito fácil se torna a atitude censurável, rica de observações deprimentes, sempre lúcida no seu aspecto perverso, semeando dissensão e desencanto em torno de si, de alguma forma tornando-se centro da ocorrência.
O ressentimento demorado transforma-se num bafio pestilento que invade as áreas nobres do cérebro, perturbando-lhe as neurocomunicações, por consequência, dando origem a transtornos de variada catalogação.
A mente saudável sempre emite ondas de harmonia psíquica, enquanto aquela que se desvia das finalidades do bem produz energias para anular as ideias dignificantes, comprazendo-se em albergar as construções morbígenas que a enfermam.
Quando o ego não consegue exaltar-se através da fatuidade e da presunção, sente-se ferido, ataca e faz-se mais agressivo quando não encontra resistência, oposição, de que necessita para nutrir-se.
Não reagir ao mal do rancoroso, ao invés de ser uma atitude significativa de fraqueza moral, constitui uma verdadeira fortaleza espiritual daquele que padece os espículos disparados pela inferioridade de quem se lhe volta contra.
Carregar um sentimento semelhante, revidando acusações, entrando em debate inútil, constitui uma forma de armar-se e perder a serenidade.
Somente porque alguém se transforma em inimigo de outrem, esse não tem por que preocupar-se com a sua insânia, devendo prosseguir em paz.
Há, no entanto, eficiente antídoto, que não deve ser olvido, sempre que o ressentimento ensaie instalar-se nas paisagens mentais...
Trata-se do perdão incondicional, irrestrito.
*
O perdão é valioso recurso psicoterapêutico para as insinuações melindrosas do ressentimento.
Evitar-se a reclamação e a queixa contumazes é evidência de equilíbrio, de respeito pelo conjunto social. No entanto, ocasião surge em que se não pode conivir com o erro, deixando-se de advertir o equivocado quando a circunstância assim o ensejar, de chamar a atenção de alguém que se encontra em desalinho comportamental, no entanto, sem derramar fel na advertência nem chibatear com o verbo aquele que se apresenta leviano ou irresponsável.
Muitas pessoas egoístas e insensatas, embora se encontrem na ignorância em torno da realidade, comportem-se de maneira reprochável, não admitem ser admoestadas, como se tudo devesse estar submetido à sua conduta enfermiça.
Desse modo, cumpre ao cidadão ordeiro não permitir que o desequilíbrio tome conta do grupo social, receando sensibilizar esses indivíduos perturbadores do bem-estar dos outros, portadores de tal egoísmo que de olvidam dos demais para comportar-se inadequadamente lhe apraz.
Contribuir para a manutenção da harmonia é dever de todos, porque somente assim é possível fomentar-se o progresso, não se tornando, em consequência, um fiscal do comportamento alheio, um novo dono de tudo...
Diante, porém, dos ressentidos, a atitude de perdão para com eles deve expressar-se como tolerância e bondade, mantendo a compreensão em torno da sua dificuldade de agir corretamente, assim entendendo a sua incapacidade momentânea de manter-se em equilíbrio, abrindo espaço interior para a compaixão fraternal.
Dando-se direito de o outro, o seu próximo, estagiar em nível evolutivo mais atrasado, apresenta-se o interesse de o ajudar a crescer, não lhe exigindo conquista além das possibilidades de que se encontre possuído.
Essa visão fraternal enseja incomparável bem-estar, uma sensação de encontrar-se em harmonia, não se exaltando com os arroubos do entusiasmo em considerações de ser melhor do que os outros, assim como não se aturdindo ante as injunções negativas e perniciosas.
O perdão, o que equivale à compreensão do outro na sua situação ainda deplorável, exterioriza o equilíbrio interior, a harmonia existente entre o físico, o psíquico e o emocional.
Não se permitas, pois, acolher os miasmas do ressentimento que dá azo à antipatia e à animosidade.
Não te sintas discriminado, mal-amado, injustiçado, sempre amado...
As acusações que fazes, informando que os outros estão contra ti são síndromes doentias do ego dominador, desejando submeter as outras ao seu talante, conforme já o conseguiu em relação a ti.
Mantém-te jovial, mesmo nas circunstâncias adversas, não permitindo que os desvarios de fora, os petardos mentais venenosos que são dirigidos contra ti desajustem os equipamentos eletrônicos da tua casa mental e do teu sistema emocional.
Quando cogitas que os outros são opositores teus, desvelas o teu conflito em relação a eles.
Se não existe motivo real para que as demais pessoas apresentem-se indispostas ou indiferentes à tua existência, por que manteriam atitudes inamistosas?
Como depreenderás facilmente, o teu mau-humor e indisposição constante, assim como o teu temperamento rebelde são só responsáveis pelas suspeitas infundidas, geradoras do ressentimento.
*
Se buscas urze na seara, mesmo o trigo generoso te parecerá terrível escalracho.
Se a tua óptica está voltada para a censura, o céu que contemplas sempre se apresentará nebuloso e ameaçador.
Se esperas aplauso e entendimento, todo o reconhecimento e a afeição que te sejam doados, parecerão insuficientes para a tua exaltação.
Assim sendo, ama, sê o irmão do caminho, o samaritano da parábola, o cireneu gentil, e descobrirás que o ressentimento é morbidez que já não existe na tua conduta cristã e espirita, ou, genericamente, na tua cidadania.
Joanna de Ângelis por Divaldo Franco do livro:
Atitudes Renovadas
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