Em que dia
Rabindranath Tagore
Nota: Conservamos a mesma formatação existente no livro. RDB
- Para seguirmos corretamente o espiritismo, devemos submeter todas as mensagens mediúnicas ao crivo duplo de Kardec, sendo eles, a razão e a universalidade.
Nota: Conservamos a mesma formatação existente no livro. RDB
A juventude é a fase das esperanças e dos entusiasmos. José Ingenieros acentuou, em As Forças Morais, que “a juventude toca a rebate em toda renovação”. Mas na verdade falta-lhe a experiência, a vivência existencial (pois cada existência traz os seus problemas novos) para que ela possa controlar as suas forças e aplicá-las com eficiência. O Espírito, esse “inquilino do corpo” como Emmanuel o chama, precisa de tempo para dominar a nova situação em que se encontra. Lembremos que Jesus só se entregou à sua missão na idade madura e Kardec só iniciou a Codificação do Espiritismo aos cinquenta anos de idade.
Devemos nos lembrar, por outro lado, que cada Espírito traz as suas dificuldades e muitas vezes precisa vencê-las na fase juvenil a fim de sentir-se desembaraçado na madureza e na velhice, para o cumprimento de seus novos encargos. Não é fácil atirar à beira do caminho os pesados fardos do passado, o que não raro demanda longos sacrifícios. Ingenieros tem razão ao assinalar a função renovadora da juventude, mas ele mesmo adverte que há jovens-velhos e velhos-jovens. Hoje, que a população mundial cresce velozmente, os jovens são maioria e fazem sentir a sua presença em todos os setores de atividade. Não obstante, são ainda os homens maduros e os velhos que dirigem o mundo. E até mesmo no campo novíssimo da Astronáutica a experiência da maturidade se impôs sobre os arroubos da juventude.
A razão de Emmanuel é evidente. Não podemos crer em velhice quando vemos que o tempo nos traz a riqueza da experiência. Não há limite preciso entre juventude e velhice, quando o “inquilino do corpo” conseguiu dominar o seu instrumento e conservá-lo viril através dos anos. Esse “inquilino”, o Espírito, não envelhece. Pelo contrário, o tempo o aprimora e aguça, dando-lhe a juventude que se repete, cada vez mais bela e segura, em cada nova encarnação. A juventude terrena é um tempo de preparação do homem em cada existência. A juventude espiritual é a atualização dos poderes do espírito de maneira definitiva, acima da transitoriedade da matéria.
Respondeu-lhe Jesus: - Ninguém, tendo posto a mão ao arado e olhando para trás, é apto para o reino de Deus. (Lucas: 10:16)
Todo aquele que busca seguir Jesus, não tem passado, nem presente, apenas o futuro.
A sua é a decisão de vir a ser, das suas possibilidades de crescimento e de renovação interior permanente.
Surgida a oportunidade do encontro com o Mestre, nem sempre a pessoa logra desatar-se das amarras constritoras do passado.
Não raro, esse passado constitui uma terrível marca na trajetória da evolução humana.
Vive-se de recordações ingratas que o assinalaram dolorosamente; de reminiscências amargas, quando se sonhava com o amor e a ternura; de evocações dos momentos de ansiedade e amargura que se pensava seriam de bênçãos e renovação transcendente; de apelos às horas da escravidão aos gozos que se converteram em tenazes de dor, dilacerando os mais belos sentimentos...
Desfilam, então, pela mente, as frustrações e os desejos não fruídos; as decepções e os anseios que ficaram ceifados; os abandonos a que se viu relegado mil vezes, e, por tudo isto, e muito mais, não pode seguir adiante, porque se detém, olhando para trás.
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Não poucos homens e mulheres, igualmente se demoram na paisagem das lembranças felizes que não retornarão.
Repassam, mentalmente, as alegrias experimentadas, que os emularam ao avanço e depois escassearam; os tesouros de ternura com que foram aquinhoados e hoje cessaram; as expectativas de realização externa, que abriam estradas emocionais para o progresso e agora se apresentam sem trânsito; as carícias que os enriqueceram de emoção e ora estão distantes; os folguedos e a juventude que já passaram...
Vivem de evocações que os mantêm olhando para trás, sem que se animem a reiniciar a marcha, a avançar com segurança.
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A vida terrestre, no entanto, é impermanente.
As alegrias de agora podem ser o prenúncio de lágrimas de depois. Assim como as dores acerbas deste momento, podem significar a cirurgia da libertação para os grandes voos do espírito.
Todo aquele que, realmente, encontra Jesus, é convidado a uma decisão; tomar da charrua do dever e, sem saudades nem ansiedades mórbidas, avançar, passo a passo, com equilíbrio.
A decisão é pessoal, que deve ser seguida pela ação.
Não é indispensável que se fuja do mundo ou se adote uma conduta ascética, severa, que inspira o ódio contra o mundo.
A posição ideal é a da neutralidade dinâmica. Isto é, viver no mundo sem que se lhe escravize. Fomentar o progresso com decisão, assumindo responsabilidades que promovam outros homens e as várias expressões da vida.
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Maria de Magdala, por exemplo, tomou da charrua e recuperou a virtude que a elevou às culminâncias da doação total.
Saulo, igualmente, segurou a charrua, e, sem recordar-se do passado, carregou a sua cruz e plantou-a no monte da sublimação.
Gandhi, da mesma forma, segurou a charrua e ofereceu-se em holocausto, tornando-se uma grande luz para milhões de vidas.
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Hoje como ontem a humanidade necessita de criaturas que, tomando da charrua não olhem para trás, seguindo animadas, após superadas as dificuldades habituais.
Se desejas seguir Jesus e tornar-te pleno; se almejas a renovação e a paz através do Evangelho; se queres a glória interior sem receios nem fronteiras, toma da charrua do amor clareado pela fé e, mediante a ação da caridade, não olhes para trás.
Num grupo de província, tendo-se apresentado um Espírito sob o nome de “São José, santo, três vezes santo”, deu lugar a que se fizesse a seguinte pergunta:
Um Espírito, mesmo canonizado em vida, pode dar-se a qualificação de santo, sem faltar à humildade, que é um dos apanágios da verdadeira santidade e, invocando-o, concorda que lhe deem esse título? O Espírito que o toma deve, por esse fato, ser tido por suspeito?
Um outro Espírito respondeu:
“Deveis rejeitá-lo imediatamente, pois tanto valeria um grande capitão se vos apresentando exibindo pomposamente seus numerosos feitos de armas, antes de declinar o seu nome, ou um poeta que começasse gabando os seus talentos. Veríeis nessas palavras um orgulho deslocado. Assim deve ser com homens que tiveram algumas virtudes na Terra e que foram julgados dignos de canonização, Se eles se vos apresentam com humildade, crede neles; se vierem se fazendo preceder da santidade, agradecei e nada perdereis. O encarnado não é santo porque foi canonizado: só Deus é santo, porque só Ele possui todas as perfeições. Vede os Espíritos superiores, que conheces pela sublimidade de seus ensinamentos: não ousam dizer-se santos; qualificam-se simplesmente de Espíritos de verdade.”
Esta resposta requer algumas retificações. A canonização não implica a santidade, no sentido absoluto, mas simplesmente um certo grau de perfeição. Para alguns a qualificação de santo tornou-se uma espécie de título banal, fazendo parte integrante do nome, para distinguir de seus homônimos, ou se lhes dá por hábito. Santo Agostinho, São Luís, São Tomás, podem, pois, antepor o vocábulo santo à sua assinatura, sem que o façam por um sentimento de orgulho, que estaria tanto mais deslocado em Espíritos superiores que, melhor que outros, nenhum caso fazem das distinções conferidas pelos homens. Seria o mesmo com os títulos nobiliárquicos ou as patentes militares. Seguramente o que foi duque, príncipe ou general na Terra não o é mais no mundo dos Espíritos e, entretanto, assinando, poderão tomar essas qualificações, sem que isto tenha consequência para o seu caráter. Alguns assinam: aquele que, em vida na Terra foi o duque de tal. O sentimento do Espírito se revela pelo conjunto de suas comunicações e por sinais inequívocos em sua linguagem; é assim que a gente não se pode enganar quanto aquele que começa por se dizer: “São José, santo, três vezes santo.” Só isto basta para revelar um Espírito impostor, enfeitando-se com o nome de São José. Assim, pôde ver que, graças ao conhecimento dos princípios da doutrina, sua malandragem não encontrou crédulos no círculo onde quis introduzir-se.
O Espírito que ditou a comunicação acima é, pois, muito absoluto no que concerne a qualificação de santo e não está certo quando diz que os Espíritos superiores se dizem simplesmente Espíritos de verdade, qualificação que não passaria de um orgulho disfarçado sob outro nome, e que poderia induzir em erro, se tomado ao pé da letra, porque nenhum se pode gabar de possuir a verdade absoluta, nem a santidade absoluta. A qualificação de Espírito de verdade não pertence senão a um só, e pode ser considerada como um nome próprio. Está especificada no Evangelho. Aliás, esse Espírito se comunica raramente e apenas em circunstâncias especiais. É preciso manter-se em guarda contra os que indevidamente se enfeitam com esse título. São fáceis de reconhecer, pela prolixidade e pela vulgaridade de sua linguagem.