Mediunismo, mediunidade e especialização
Marlene Nobre
Embora seja uma das funções humanas mais primitivas, a mediunidade “somente agora começa a aparecer no conjunto de atributos do homem transcendente”. (1) É natural que seja assim porque ela evolui com o próprio ser. Na longa trajetória “do átomo ao arcanjo”(2), em busca da espiritualidade superior, o espírito vem estagiando, em incontáveis encarnações sucessivas, nos organismos os mais diversos, dos cristais atômicos aos seres pluricelulares, passando por toda a escala zoológica, dos animais irracionais aos homens primitivos e atuais, despojando-se muito lentamente da animalidade grosseira.
Nesse longo trajeto evolutivo, o princípio espiritual ou inteligente vem se individualizando. Hoje, podemos dizer que não se encontra nem mesmo na metade do objetivo a ser alcançado, que é o de atingir o estágio de anjo ou de aperfeiçoamento superior, por isso, é fácil compreender as dificuldades da criatura humana em aceitar o estudo e o exercício da própria faculdade mediúnica. Não se pode esquecer que essa faculdade é neutra e independe de raça, religião e classe social. Na maior parte dos casos, nem mesmo de evolução espiritual. Por isso mesmo, é necessário fazer a distinção entre mediunismo e mediunidade.
Referimo-nos ao mediunismo quando a faculdade é conservada em estado bruto e exercida de modo empírico, sem que o médium se submeta à disciplina conferida pelo estudo e pela reforma íntima, que significa empenho em domar as más inclinações. Sem lapidação da conduta moral, de conformidade com as lições de Jesus, dificilmente a faculdade terá emprego útil. No entanto, ao contrário, o uso do termo “mediunidade” pressupõe a busca de disciplina, alicerçada no estudo construtivo e na aplicação útil, o que significa doação inteiramente gratuita dos dons recebidos da Divina Providência. Por essa razão, “a mediunidade é conferida sem distinção, a fim de que os espíritos possam trazer a luz a todas as camadas, a todas as classes da sociedade, ao pobre como ao rico; aos retos, para os fortificar no bem, aos viciosos, para os corrigir”.(3)
No estudo da mediunidade, é preciso deter-se também na questão da especialidade, pensada como importante momento da própria disciplina necessária ao bom desenvolvimento do médium. Ensina Kardec que esse estudo é necessário não só para os próprios médiuns, mas também para os pesquisadores, que precisam escolher entre os mais aptos. O espírito Sócrates (4) reforça essa necessidade na seguinte passagem:
Limitando-se à sua especialidade o médium pode aprimorá-la e obter bons resultados. [...] não é raro ver-se, infelizmente, médiuns que não se contentam com as faculdades recebidas e aspiram, por amor próprio ou por ambição, possuir faculdades excepcionais, capazes de os tornarem famosos. Essa pretensão lhes tira a mais preciosa qualidade: a de médiuns seguros!
Com Emmanuel (5), reconhecemos que “o homem enciclopédico em faculdade ainda não apareceu, senão em gérmen, nas organizações geniais que raramente surgem na Terra, e temos de considerar que a especialização na tarefa mediúnica é mais que necessária [...]”.
O próprio benfeitor espiritual deu um exemplo muito claro do que é especialização ao médium missionário Chico Xavier, seu tutelado. Segundo testemunhas, o mentor materializou-se, certa feita, na cidade de Pedro Leopoldo, em Minas Gerais, numa das aparições mais extraordinárias de que se tem notícia: todo revestido de uma túnica brilhante, que tinha à frente, em destaque, marchetada de luz, a constelação do Cruzeiro do Sul. Com a finalidade de dar um recado aos participantes, colocou um ponto final na realização dessas sessões, que contavam também com a doação ectoplásmica de Chico Xavier, porque este deveria concentrar suas energias mediúnicas na recepção de livros, sua missão principal. A especialização em mediunidade é, pois, uma necessidade. Cada médium deverá obedecer aos desígnios do mais alto, de comum acordo com o seu guia e protetor, a fim de descobrir a melhor forma de ser útil e render mais.
Por tudo quanto vimos, cremos muito justa a observação de André Luiz (6):
a mediunidade não requisitará desenvolvimento indiscriminado, mas, sim, antes de tudo, aprimoramento da personalidade mediúnica e nobreza de fins, para que o corpo espiritual, modelando o corpo físico e sustentando-o, possa igualmente erigir-se em filtro leal das esferas Superiores, facilitando a ascensão da Humanidade aos domínios da luz.
Referências Bibliográficas:
(1) O Consolador, questão n. 388.
(2) O Livro dos Espíritos, questão n. 540.
(3) O Livro dos Médiuns, Cap. XXIV, item 12.
(4) O Livro dos Médiuns, Cap. XVI.
(5) O Consolador, questão n. 388.
(6) Evolução em dois Mundos, Cap.17.
Livro: O Consolador (Emmanuel por Chico Xavier)
388 – Nos trabalhos mediúnicos temos de considerar, igualmente, os imperativos da especialização?– O homem do mundo, no círculo de obrigações que lhe competem na vida, deverá sair da generalidade para produzir o útil e o agradável, nas esferas de suas possibilidades individuais.Em mediunidade, devemos submeter-nos aos mesmos princípios. O homem enciclopédico, em faculdade, ainda não apareceu, senão em gérmen, nas organizações geniais que raramente surgem na Terra e temos de considerar que a mediunidade somente agora começa a aparecer no conjunto de atributos do homemtranscendente.A especialização na tarefa mediúnica é mais que necessária e somente de sua compreensão poderá nascer a harmonia na grande obra de vulgarização da verdade a realizar.
- Para seguirmos corretamente o espiritismo, devemos submeter todas as mensagens mediúnicas ao crivo duplo de Kardec, sendo eles, a razão e a universalidade.
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