Consequências da Doutrina Espírita
Gustave Geley
(Tradução: Luiz de Almeida)
Revista Reformador Agosto 1944 - (FEB)
“A Ciência é incapaz de nos fornecer uma explicação ou uma interpretação aceitável do Universo. Ela é incapaz de criar uma moral. Ela é incapaz, enfim, de substituir a Religião na evolução social da Humanidade." (Brunetière - "Revue des Deux Mondes", 15 octobre, 1896).
Contentemo-nos, por ora, de encarar algumas das consequências que resultarão imediatamente, sem dúvida, da constatação rigorosamente científica dos dois principais fundamentos da doutrina espírita:
1°) Persistência do eu consciente depois da morte e2°) Evolução progressiva da alma pelos seus próprios esforços.
É evidente que esta nova ciência arrastará uma revolução completa na filosofia, na moral, na vida social e individual. No domínio da filosofia, ela permitirá, enfim, por de lado, definitivamente, as obscuridades sistemáticas, as doutrinas incoerentes e caducas, sem demora esquecidas em face da simplicidade luminosa da nova ideia e, também, diante da satisfação completa que ela conduz ao nosso instinto de felicidade, ao nosso desejo de imortalidade, à nossa esperança de conhecer o Além.
Nos domínios da FÉ, ela fará desaparecer as ideias niilistas tão deprimentes e tão desesperadoras; assim também os dogmas religiosos tão pouco satisfatórios. Ela substituirá as crenças impostas pela convicção raciocinada. Desembaraçará o espiritualismo dos ouropéis sob os quais, durante tantos séculos, se esforçou por escondê-lo e mascará-lo o gosto de diversas teocracias. Ela nos libertará desses deuses antropomórficos, amiúde caprichosos e cruéis, intervindo constantemente na criação através dos milagres, da graça e da predestinação; reservando seus favores a raros eleitos; exigindo sacrifícios sangrentos e escolhendo as vítimas destinadas a "aplacar sua cólera" entre as melhores de suas criaturas, semeando as tentações sob nossos passos e, pela menor falta, punindo-nos com a eternidade; prostrando-nos, enfim, durante nossa miserável existência, com provas e dores que não são mais que o ressaibo de castigos ainda mais cruéis!
Com esta ideia nova desaparecerão certas prescrições dogmáticas impondo crenças extravagantes, restringindo, até anulá-lo, nosso livre arbítrio, estorvando nosso desenvolvimento consciente; - desaparecerá esta interpretação, incrivelmente mesquinha, do Universo, submetendo toda a criação à humanidade terrestre!
Desaparecerá o dogma do pecado original, com suas consequências injustas e bárbaras. (Consequências que vão, para certos teólogos, até à condenação das crianças mortas sem batismo.)
Desaparecerá a noção da "salvação" pelas preces e pelos sacramentos.
Desaparecerão, sobretudo, estas aberrações ferozes sobre o inferno, suas legiões de demônios e seus suplícios eternos!
Quanto estes dogmas infantis parecem miseráveis em comparação com os ensinamentos da nova filosofia: dupla ideia de involução e de evolução abarcando tudo em um panteísmo grandioso. (1) Evolução progressiva dos mundos e dos seres por suas próprias forças, sem intervenção caprichosa da divindade!
(1) A respeito destas magníficas concepções panteístas, não posso impedir-me de citar as belíssimas almas palavras de M. Marius George - Humanité integrale, janeiro de 1896 - "parafraseando uma citação célebre, eu disse uma vez: sou homem e tudo que toca ao homem me é muito caro; mas o que deveria realizar-se fora de seu destino não poderia tocar-me. Se existe um Deus ou vários deuses, anjos ou arcanjos não tendo jamais conhecido nem o esforço, nem a luta, nem o sofrimento, não tendo jamais atravessado a noite angustiosa da ignorância, estes seres exteriores não me são nada, não sendo humanos. Eu não quero e não posso receber por irmãos, mesmo que tão alto estejam na glória, senão os primogênitos em humanidade, os vencedores das nossas mesmas misérias, aqueles que, embora possuindo mais luz, irradiando mais amor e harmonia, passaram também maior tempo que nós pela luta, pelo sofrimento e pela conquista."
"A mais alta ideia que se pode fazer de um ordenador, disse justamente Léon Denis, é de supô-lo formando um mundo capaz de se desenvolver por suas próprias forças e não por contínuos milagres ... "
A divindade não pode ser compreendida fora do Universo.
“A ideia de Deus não exprime mais hoje, para nós, um ser qualquer, mas a ideia do ser, o qual contém todos os seres... Nada de criação espontânea, nascida, miraculosa; a criação é continua, sem começo nem fim... O mundo se renova incessantemente em suas partes, mas no conjunto ele é eterno. (Léon Denis - "Depois da Morte".)
A terra sobre a qual, segundo expressão de Flammarion, as religiões querem concentrar todo o pensamento do Criador, não é senão um ponto insignificante no Universo. Uma só existência sobre esse planeta, por outro lado, não é mais que um momento insignificante na série das encarnações numerosas do ser vivente. A alma individual não foi criada completa, com as faculdades que desejou assinalar-lhe o capricho do Criador. Forma-se e se desenvolve ela mesma pelos seus esforços, seus trabalhos e seus sofrimentos. De si própria que se liberta então, pouco a pouco, do mal agarrado necessariamente nas fases inferiores de sua evolução; dela mesma é que chega à compreensão do verdadeiro, do belo e do bem; que retirará lentamente os elementos conquistados para sua felicidade futura.
No Além, a compreensão perfeita das desigualdades humanas e a solução completa do problema do mal - estas duas condições da vida terrestre - é que se conciliam tão dificilmente com a noção de uma Providência ativa.
As desigualdades humanas, sob o ponto de vista da inteligência, da consciência e do coração, desigualdades que nem a hereditariedade, nem a influência do meio explicam suficientemente, encontram sua interpretação fácil nas diferenças evolutivas dos seres.
"A pluralidade das existências pode, sozinha, explicar a diversidade dos caracteres, a variedade das aptidões, a desproporção das qualidades morais, em uma palavra, todas as diferenças que ferem nossos olhares... Sem a lei da reencarnação é a iniquidade que governa o mundo". (Léon Denis)
A explicação do mal não é menos satisfatória. O mal não é o produto das forças cegas da Natureza, impondo às nossas personalidades efêmeras sofrimentos sem compensação. Não é a consequência injusta de um pecado original; não é uma experiência, ainda menos castigo ou vingança da divindade.
O Mal é tão somente a medida da inferioridade dos mundos e a condição necessária para seu aperfeiçoamento.
O mal é o grande aguilhão da atividade dos seres, necessário para impedir sua imobilização no estado presente. Mesmo na humanidade avançada, a dor física ou moral desfruta de um índice expressivo. Ela impõe o trabalho e impede o retardar-se durante muito tempo nos prazeres inferiores.
Certos privilegiados da existência poderão perder vidas inteiras na ociosidade, mas cedo ou tarde sofrerão a advertência do mal. A doença, um grande desgosto, a dor sob qualquer de suas formas, o fará compreender a inutilidade dos prazeres materiais, lastimar o tempo perdido e, então, lhe dará uma ideia mais elevada e, consequentemente, o desejo da verdadeira felicidade.
Sob condições evolutivas o mal é inevitável. Mesmo seus excessos, as grandes catástrofes, as infelicidades imerecidas, são a consequência do livre desenvolvimento dos mundos pelas suas próprias forças, e não poderiam ser reprovados pela divindade.
O mal diminui paulatinamente consoante a escala da evolução. A história da Terra, desde os tempos mais remotos até nossos dias, é uma prova evidente disso. Não há mais lugar, em face desta interpretação do Universo, para as ideias de paraíso ou de inferno. Punições e recompensas vêm de nós mesmos e são a consequência natural, forçada, de nossas faltas ou de nossos esforços.
"A vida atual (Léon Denis) é a consequência direta, inevitável, de nossas vidas passadas, como nossa vida futura será a resultante de nossas ações presentes. (2) Nós somos aquilo que somos feitos, por nós mesmos.
(2) Não se poderá censurar a possibilidade de exceções acidentais, impondo encarnações dolorosas imerecidas. Semelhantes acidentes são inevitáveis, nada tendo com a intervenção de uma Providência em nossa evolução. Mas eles serão compensados nas encarnações ulteriores. É necessário encarar o conjunto e não os detalhes; e pensar bem que uma só existência não é quase nada, no curso de nossa evolução. Quase sempre aliás, as provas e os sofrimentos foram prévia e livremente escolhidos pelo Espírito antes de sua reencarnação, no seu interesse ou pelo de seus semelhantes.
A sanção de nossas faltas será simplesmente o estacionamento nas encarnações inferiores, segundo as condições que resultam, matematicamente, para cada existência, das existências já vencidas. A recompensa e compensação que devemos esperar de nossos esforços, de nossos sofrimentos, de nossas virtudes, é a passagem para um estado superior, e esta recompensa resultará das leis evolutivas e não de um julgamento divino. Nosso progresso nos assegurará a felicidade, resultado natural da diminuição do mal, coincidindo com o desprendimento da consciência, da liberdade e das faculdades emotivas. Esta felicidade nós a obteremos apenas pelo nosso merecimento, em virtude dos livres esforços.
Para ser capaz de admirar um estado superior é necessário, antes de tudo, elevar-se ao seu nível. Não se poderá desfrutar de um bem que não seja compreendido.
Não vejamos, sem sair da vida ordinária, pessoas incapazes de saborear prazeres estéticos, de apreciar a beleza, de experimentar emoções elevadas! Não procuremos saber em que consistirá nossa felicidade futura. O desenvolvimento prévio é a condição necessária, não somente para a obtenção, mas também para a compreensão desta felicidade. Isto basta para saber que ela resultará, necessariamente, dos progressos evolutivos.
Gustave Geley
Revista Reformador Agosto 1944 - (FEB)
Veja o artigo de agosto de 1944:
Nota do tradutor (Luiz de Almeida) - O excerto presente foi extraído do "Essai de revue génerale et d'interprétation synthétique du Spiritisme", do famoso sábio francês Dr. Gustave Geley que, a 28 de janeiro de 1918, perante a Sorbonne, deu conta de seus primeiros trabalhos, no domínio das ciências psíquicas. Grande foi sua contribuição ao assunto pois que, em outros livros de notável transcendência, depôs o fruto de suas experiências aclaradas à luz da análise fria e meticulosa. Cumpre assinalar, entanto, para esclarecimento do leitor, uma ressalva do texto, no trecho em que o autor se refere ao termo - panteísmo. Aqui, não se justifica, a rigor, o significado filosófico delineado como sistema religioso. Ele quer admitir o que a razão comum acolhe: sendo as criaturas partículas divinas, cabe em todas elas a essência do Criador. Os Atos dos Apóstolos testificam, nos v. 28 e 29, cap. 17: "Porque nele vivemos e nos movemos, e existimos, como também alguns de vossos poetas disseram: pois somos também sua geração. Sendo nós, pois, geração de Deus, etc.". Em outro número daremos algumas das Consequências Morais que o ilustre psicólogo anteviu, como fundamento pré-estabelecido, para o círculo da conduta humana, dilatado pela força incoercível da Nova Revelação.
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Revista Reformador Ago. 1944 |
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