sexta-feira, 17 de maio de 2024

Honestidade emocional

Honestidade emocional

Hammed



"(...) no estado de enfermidade, o cérebro está sempre mais ou menos enfraquecido, não existe equilíbrio entre todos os órgãos, alguns somente conservam sua atividade, enquanto que outros estão de alguma sorte paralisados; daí a permanência de certas imagens que não são mais apagadas, como no estado normal, pelas preocupações da vida exterior. Aí está a verdadeira alucinação e a causa primeira das ideias fixas".  (O Livro dos Médiuns 2ª Parte, cap. VI, item 113.)
Um indivíduo em estado de fixação mental nada vê, nada ouve, nada sente ou nada percebe além da pessoa, objeto ou fato a que sua mente cristalizada se prendeu.

A fixação mental pode perdurar por séculos, ou seja, por diversas encarnações. A alma se isola do mundo externo, passando a visualizar unicamente o centro do desequilíbrio, permanecendo paralisada, dominada por ocorrências ou fatos aflitivos, recentes ou remotos.

Trata-se de uma verdadeira tortura mental sobre a qual o enfermo não tem nenhum controle. A fronte pensadora mantém um diálogo ininterrupto: vive em constante conversa de si para consigo mesmo.

A mente se fixa em determinada criatura ou acontecimento e fica incapaz de evitar que os pensamentos, as discussões e as palavras continuem girando sem parar. O mundo mental se torna hiperativo; repete o mesmo problema muitas vezes, levando a criatura à fadiga, acompanhada de uma sensação de cabeça pesada e de sobrecarga íntima.

A perturbação interior pode imobilizar-nos por tempo incalculável entre os fios de sua "textura de escuridão". A alma infeliz se faz prisioneira não só de inimigos externos, mas, sobretudo, dos mais ferrenhos inimigos: os internos.

Indivíduos doentes contemplam tão somente, e por largo tempo, as aflitivas criações mentais deles mesmos, ficando obstruída a possibilidade de observarem novas e edificantes paisagens de desenvolvimento e crescimento espiritual. São processos de monoideísmo, verdadeiros estados mentais alucinatórios, em que vivem isolados em circuitos fechados. São aprisionados nos próprios painéis íntimos e justapostos às criaturas afins, desencarnadas ou não, coagulando ou materializando imagens repetidas por associação individual e espontânea.

Reservados, insociáveis, carrancudos, tímidos, envergonhados, superssensíveis e desprovidos de humor, eis as características mais frequentes desses indivíduos.

Na mansão do pensamento, o raciocínio emite as ordens, mas é o sentimento que guia. A pessoa que não consegue aproximar-se dos outros e expressar suas emoções cria uma aversão à afetividade; reduz cada vez mais sua capacidade amorosa, tornando-se indiferente e apática.

As criaturas desenvolvem um "mecanismo de distância", isto é, cultivam um "isolamento alucinatório". Vivem numa espécie de desonestidade emocional, criando um afastamento não apenas do mundo, mas também de si mesmas.

"(...) a permanência de certas imagens que não são mais apagadas, como no estado normal, pelas preocupações da vida exterior (...)" e "(...) a verdadeira alucinação e a causa primeira das ideias fixas (...)" podem estar potencialmente ligadas ao fato de não expressarmos nossos sentimentos ou emoções.

Criamos um bloqueio mental e/ou emocional, separando o nosso horizonte contextual e o nosso conteúdo sentimental, o que resulta na perda do verdadeiro significado de nosso mundo afetivo.

Estar com medo ou negar o que sentimos pode nos levar a uma situação que provoca alucinação. A criatura não consegue resolver-se, por ignorar suas reações emocionais, nem mexer-se, porque se autodistrai, criando uma ideia fixa que a mantém imobilizada ou paralisada intimamente.

Aprender a identificar o que estamos sentindo é um desafio que podemos dominar, mas não nos tornamos especialistas da noite para o dia. Ignorar as sensações não faz com que os sentimentos desapareçam.

Muitos de nós tentamos nos convencer de que não devemos entrar em contato com nossos sentimentos; ficamos hábeis em seguir as regras do "não sinto nada" ou "não devo sentir isso". De todas as proibições que tivemos, essas talvez sejam as regras mais duradouras e persistentes em nosso mecanismo mental.

Precisamos deixar um espaço para trabalhar nossos sentimentos e emoções. Somos seres humanos, não marionetes.

Quem somos, como amadurecemos, como vivemos e como crescemos, tudo está intimamente interligado com nossa área emocional - uma parte preciosa de nós mesmos. Realmente temos sentimentos, às vezes difíceis e problemáticos, outras vezes explosivos, que precisam ser reelaborados ou transformados. Não precisamos reprimi-los rigidamente, nem permitir que eles nos controlem ou nos imponham atos e atitudes. Lembremo-nos de que apenas podemos nos redimir até onde conseguimos nos perceber, ou seja, até onde nos permitirmos sentir.

Como nos reformar, se evitamos constantemente nossas sensações? Muitos de nós ficamos longo tempo ligados na negação. A "negação" é considerada um mecanismo de defesa que nos protege até que possamos ficar equipados para lidar com os fatos da vida, dentro e fora de nós. Mas não devemos passar muito tempo negando a realidade.

A alucinação ou a ideia fixa, tanto consciente quanto inconsciente, limita a nossa liberdade de ação nas atividades mediúnicas, como também nos diversos setores da vida. Toda ilusão deixa a criatura obcecada, e não admitir o que se sente é uma forma de autoilusão. Para não ficarmos enredados nas malhas da fixação mental, precisamos entrar em contato com o "chão da realidade".

A cura definitiva para esse tipo de mal é aprimorar nossos sentimentos e abrandar nosso coração, identificando com atenção as reações interiores e transformando-as para melhor.

A Vida Maior não tenta distanciar o homem da Natureza, mas facilitar sua conexão com ela. Portanto, mais cedo ou mais tarde, o homem terá de voltar à naturalidade da vida, destruindo gradativamente os excessos do formalismo social e religioso e os exageros do artificialismo das convenções, que contrariam as leis naturais e, por consequência, geram conflitos ilusórios e perturbação íntima.

A edificação da paz no reino interior se estabelece em nós definitivamente quando começamos a cultivar a "honestidade emocional" em todas as nossas relações, com nós mesmos ou com os outros.

Hammed por Francisco do Espírito Santo Neto do livro:
A imensidão dos Sentidos

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