Vida antes da vida
Hermínio C. Miranda
Se fosse organizar uma antologia das frases e expressões de minha predileção na Doutrina Espírita uma delas seria aquela que nos recomenda um acoplamento entre fé e razão para ensinar que elas não se excluem mutuamente. Outra frase seria a de que o Espiritismo nada tem a temer quanto ao desenvolvimento da ciência. Kardec via nas estruturas doutrinárias espaço para acomodar os novos conhecimentos que fossem emergindo no correr do tempo. Convicto da solidez do edifício que vira crescer aos seus olhos, tanto quanto da flexibilidade que deve possuir toda doutrina evolutiva, ele admitiu mesmo a possibilidade de certas modificações eventuais que jamais poderiam afetar os conceitos fundamentais do pensamento dos Espíritos, como sobrevivência, reencarnação, comunicabilidade, existência de Deus, sem o quais se tornam incompreensíveis os mecanismos da vida.
Vivemos um período histórico de verdadeira explosão científica. Nunca se pesquisou com tamanha intensidade e amplitude. Os meios de comunicação conseguem transmitir apenas uma pálida ideia do que se processa no laboratórios e gabinetes por toda parte. Os livros de divulgação já saem obsoletos em pontos essenciais e não são poucos os autores que precisam reescrever capítulos inteiros e corrigir conclusões, aditar notas de rodapé ou acrescentar apêndices no esforço de acompanhar o rumo acelerado das descobertas.
Um bom sinal em tudo Isso, porém, é que, além de explorar o mundo que nos envolve desde a intimidade do átomo até ao mistério dos "buracos negros", as atenções começam a voltar-se para o panorama interior do ser humano. Muitos já perceberam que o homem e a mulher não são apenas maravilhosos sistemas biológicos, o que já seria algo de fantástico. Deseja-se saber não apenas como funciona o corpo humano, mas que ou quem o faz funcionar. Ou seja: procura-se, um tanto às cegas ainda, mas procura-se, uma fórmula racional para expressar o dualismo espírito/matéria. Nem todos estão preparados para adotar a palavra espírito, porque temem suas implicações metafísicas. Respeitemos seus temores mesmo sem os aceitar, mas saudemos com interesse as informações que estão sendo obtidas sobre a mente, o psiquismo, o corpo bioplasmático e tantas outras expressões circunloquiais. A gente vai lendo e "traduzindo" para a terminologia a que está habituada, da mesma forma que aipim, mandioca e macaxeira são a mesma coisa em diferentes pontos geográficos do Brasil.
Uma visão retrospectiva sobre o material que temos lido nos últimos dez anos em publicações e livros europeus e americanos nos proporciona estimulante perspectiva, em termos de aproximação e até mesmo de identidade com importantes postulados espíritas.
Acho mesmo que se pode configurar com muita nitidez a ênfase em expor temas que a ciência oficial até pouco tempo considerou verdadeiros tabus intocáveis, como existência do espírito, sobrevivência, reencarnação e comunicabilidade.
É de justiça reconhecer neste campo o trabalho pioneiro da Dra. Elisabeth Kübler-Ross, médica suíça radicada nos Estados Unidos. Na sua lista de prioridades ela colocou em primeiro lugar o problema da morte. É claro que ela estava interessada numa definição mais precisa do fenômeno e uma determinação clínica mais exata do momento em que o ser vivo pode ser declarado morto. O que mais fundamente lhe interessava no entanto, era desmistificar a morte. Por que esse medo irracional da morte? Por que as aflições exageradas de quem parte e de quem fica? Por que esconder do doente terminal a sua condição?
Entende a Dra. Kübler-Ross que a morte é um fenômeno natural, sequência normal do que chamamos vida, não é para ser temida e sim compreendida para poder ser aceita. Em suma, era preciso desenvolver um programa racional de educação para a morte, uma doutrina de aceitação da morte.
Seu primeiro livro em 1969 foi sucesso imediato. Chamou-se "On Death and Dying" (“Sobre a Morte e a Agonia”). Abriu caminho para outros depoimentos e estudos, bem como para assuntos paralelos. A observação mais serena do processo revelou inesperados aspectos, como da “morte provisória", ou seja, uma incidência muito grande de casos bem documentados de retorno à vida de pessoas declaradas clinicamente mortas.
Nessa faixa específica de observação, "estourou" de surpresa em 1975 outro livro de sucesso, o hoje famoso “Life after Life" ("Vida depois da Vida"), no qual o Dr. Raymond A. Moody Jr. expunha e comentava, numa fria linguagem de relatório, interessantes casos de morte provisória. O livro foi prefaciado pela Dra. Kübler-Ross cujo trabalho até então fora desconhecido do Dr. Moody, tanto quanto ela própria desconhecia o trabalho paralelo do seu colega. Em 1977 o Dr. Moody publicou outro livro sobre o assunto, alargando consideravelmente as vistas que se abriam diante dele. O novo livro chamou-se "Reflections on Life after Life" ("Reflexões sobre a Vida depois da Vida").
Em 1978 a Dra. Edith Fiore, doutora em psicologia, publicou "You Have Been Here Before" ("Você esteve por aqui antes"), no qual relata suas experiências terapêuticas com o instrumento da regressão de memória às vidas anteriores.
Embora, de certa forma, repetindo o trabalho pioneiro do Dr. Denis Kelsey, a Dra. Fiore apresenta um estudo rico, bem documentado, muito valioso, no qual, ainda um tanto perplexa, é arrastada irresistivelmente à aceitação da doutrina da reencarnação e, logicamente, à da responsabilidade pessoal de cada um de nós pelos erros e acertos passados.
Explorando a outra ponta do trabalho do Dr. Moody, em “Life after Life”, a Dra. Helen Wambach publicou em 1979 seu notável "Life before Life", ou seja, "Vida Antes da Vida" (Edição Bantam Books, New York).
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Helen Wambach é doutora em psicologia e segundo nota biográfica inserida em seu livro, "está-se tornando rapidamente em a mulher sobre a qual mais se fala e escreve hoje na América". Por quê? Seu livro "Recalling Past Lives: The Evidence From Hipnosis" ("A Recordação de Vidas Passadas: A Evidência da Hipnose") foi êxito imediato. Suas observações e conclusões começaram a ser amplamente discutidas em artigos assinados. Mais importante, porém, foi a resposta popular, por meio de cartas e telefonemas de inúmeros pontos dos Estados Unidos, declarando sua pesquisa "absorvente e significativa."
Tão significativa quanto a pesquisa, a meu ver, é a acolhida inequívoca manifestada pelos leitores da Dra. Wambach às suas ideias, que, evidentemente, estão encontrando encaixes e ressonâncias no espírito público. Ou, para dizer de outra maneira: estão correspondendo a uma necessidade de informação lógica e aceitável acerca dos problemas humanos que a ciência oficial ainda se recusa teimosamente a discutir. O público leitor é muito mais inteligente do que supõem inúmeros representantes da ciência acadêmica, também muito mais aberto e está sempre disposto a encaminhar ideias novas, desde que apresentadas de maneira adequada e num contexto lógico, por mais que tais ideias se choquem com antigas tradições culturais. As crenças ortodoxas combatem a reencarnação? E dai? Se a reencarnação é uma ideia racional, como é, e explica aspectos ainda inexplicados do ser humano, logicamente as crenças dogmáticas é que estão sendo questionadas na sua irracionalidade inaceitável e não a reencarnação.
Há outro aspecto nessa atitude popular de aceitação e até de entusiasmo - ela indica uma tendência que se vai tornando irreversível. Dentre em pouco, os obstinados cientistas materialistas estarão falando sozinhos ou, no máximo, conversando uns com os outros, ilhados no território da negação de uma realidade irrecusável. É claro que uma ideia não é boa simplesmente porque as multidões a aceitam, mas é igualmente claro até este momento que a ciência oficial tem sido simplesmente caótica no seu birrento esforço de tentar explicar tudo no ser humano em termos de matéria bruta, mero conjunto de átomos, moléculas e células que aprenderam a "orquestrar” junções bioquímicas por meio de automatismos evolutivos.
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A Dra. Wambach declara na Introdução ao seu livro que se tornou psicóloga porque achou que essa era a forma de "chegar até as pessoas e aprender como funciona a mente humana". Lecionou a matéria durante 12 anos e acabou achando enfadonho o processo. Quanto à pesquisa era, na sua opinião, algo rotineiro que algumas pessoas de jaleco branco faziam com jovens estudantes e ratos brancos, mas nada mais tinha a ensinar-lhe. Como continuava Interessada no ser humano especificamente, começou a dedicar-se psicoterapia. Encontrara, afinal, o caminho. Em 20 anos nessa atividade jamais encontrou duas pessoas iguais nem uma explicação que servisse pelo menos para dois casos. Cada pessoa era um caso e cada caso tinha uma logística diferente.
Seu interesse, porém, não era meramente profissional. Ela, também, é um ser humano e àquela altura “Já vivera 53 anos no tumultuado século XX”, e fazia a mesma as perguntas que tanta gente faz. Que é a vida? Que é a morte? Por que estamos aqui na Terra? "A fome pela compreensão mais profunda é muito ampla em nossa cultura", diz ela. E como as respostas são confusas e/ou contraditórias, também as pessoas e a própria sociedade vão-se tomando confusas e contraditórias. A civilização multiplicou as potencialidades do ser humano, criando praticamente um semideus, mas não conseguiu eliminar a ignorância acerca de sua essência, de suas origens e da finalidade da vida.
Foi para responder a si mesma que ela resolveu mergulhar nas profundezas dos seus semelhantes. Que tal começar pela hipnose?
Pouco a pouco uma técnica foi-se desenvolvendo e consolidando e a Dra. Wambach começou a fazer aos seus pacientes as perguntas para as quais não encontrara respostas convincentes nos tratados que estudara durante longos anos. O método da regressão de memória com o qual passou a trabalhar revelou prontamente que há uma vida antes da vida. A partir desse conhecimento-premissa ela montou um esquema de perguntas típicas. Alguém ajudou você a escolher as condições desta vida? Em caso positivo qual a sua relação com esse conselheiro? Como você se sente ante as perspectivas de viver essa próxima existir nela? Qual a razão pela qual você decidiu nascer no século XX? Você decidiu também acerca do seu sexo? Por que você optou em ser homem ou mulher desta vez? Que objetivos você traz para desenvolver nesta existência? você conheceu seus pais em alguma existência anterior? Se conheceu, qual o relacionamento entre vocês? De que maneira você vê o feto que será você mais tarde? Está dentro dele? Ou fora? Ou entrando e saindo? Em que ponto você uniu-se ao feto?
A Dra. Wambach é uma pesquisadora atenta e meticulosa. Ao escrever eu seu livro havia coletado e catalogado metodicamente toda a experiência com 750 pacientes. Organizou questionários minuciosos, classificou os assuntos, distribuiu os fatos mais significativos estatisticamente e, acima de tudo observou com inteligência e proclamou com indiscutível coragem suas conclusões.
Seu livro é muito informativo e está repleto de surpresas até mesmo para aqueles que têm conhecimento mais avançado das questões que ela aborda. A muita gente boa - inclusive e principalmente colegas seus - ele deve ter causado verdadeiros “choques sísmicos" com as suas afirmativas.
Para o leitor espírita é uma alegria verificar que, embora lhe faltem ainda certos conceitos doutrinários que muito o ajudariam na formulação do seu pensamento, a substância da sua pesquisa vem encaixar-se com indiscutível precisão nas estruturas espíritas.
- Por alguma razão que não compreendo - escreve ela à pág. 21 - as experiências que antecedem ao parto e as do parto são mais perturbadoras para as pessoas do que as de recordar suas existências anteriores.
Não sei se a generalização, ampla demais, é válida para todos os casos. O trauma físico e psíquico do nascimento é realmente sério, mas não é nada fácil viver determinadas vidas em que o espírito resvalou pelo abismos de erros clamorosos. De qualquer maneira, porém, nascer é sempre um momento de tensão para o espírito reencarnante. Embora, munido das melhores intenções e trazendo um programa de trabalho regenerador e, ainda, contando com o apoio de amigos encarnados e desencarnados, a probabilidade do malogro dificilmente poderá ser desconsiderada de todo.
Após uma experiência dessas, uma senhora declarou à Dra. Wambach que nas duas vidas que conseguira recordar naquela noite a morte fora uma experiência agradável. "Nascer é que parece ser a tragédia."
Foram muitos os que declararam sua relutância em nascer.
- Eu não queria - disse outra mulher - porque não achava que estivesse preparada. Eu sabia que a finalidade desta vida era a de aprender a aceitar meu pai como a pessoa que ele é e, ainda, conhecer melhor minha mãe, que foi minha melhor amiga numa existência anterior. Ambos estariam vivos desta vez e essa é a razão pela qual escolhi esta época.
Era, portanto, uma questão de oportunidade que o espírito não quis perder. Aliás, 81 por cento dos 750 casos pesquisados declararam que haviam decidido livremente nascer, nas condições em que nasceram, ainda que às vezes a decisão fosse penosa e difícil.
- Sim, decidi nascer, mas estava em pânico - declarou a pessoa do Caso A-493. - Não foi uma decisão tranquila. Quando você perguntou se alguém me ajudou a escolher, eu tive consciência da presença dos meus guias, que pareciam amplos raios de luz influindo para que eu não nascesse agora, mas eu estava decidido. Minhas impressões acerca das perspectivas da existência seguinte eram no sentido de que eu a queria e sabia que minha mãe não estava preparada e que aquela família não era apropriada. Mas eu tinha algumas coisas a fazer e três tarefas cármicas a realizar.
Se 81 por cento declaravam que definitivamente haviam decidido espontaneamente nascer, os restantes 19 por cento disseram não ter conhecimento da escolha ou não haverem no momento da pergunta formulado nenhuma ideia.
Desse total, 68 por cento declararam-se inequivocamente relutantes, tensos ou resignados ante a perspectiva de uma nova existência. A surpresa maior foi a de que 90 por cento achavam que morrer era uma experiência agradável - nascer é que era algo desconfortante e assustador.
- Havia um grupo de pessoas dizendo que eu devia nascer, mas não gostei nada daquilo. Tinha, porém, a impressão de que eu tinha que nascer. (Caso B-76.)
- Oh! tenho que passar por isso tudo outra vez? (Caso B-81.)
E por que razão a escolha desta época? Vejamos algumas respostas típicas.
- ... porque muitos espíritos evoluídos estão nascendo agora e estamos mais perto de conseguir a paz mundial e um sentimento de integração da humanidade. (Caso A-384.)
- ... muitas almas estão vindo juntas agora e meu espírito estava consciente disso. (Caso A~415.)
- Sim, escolhi esta época porque mudanças monumentais ocorrerão. (Caso A-476)
- Porque é um período de grandes mudanças. (Caso A-21.)
- ... para ter contato com algumas pessoas em particular que também escolheram esta época. (Caso B-12.)
- ... Porque algumas pessoas; com as quais eu precisava desenvolver certo relacionamento também estariam vivendo nesta época. (Caso B-70.)
E a escolha do sexo?
- Decidi vir como mulher porque ela é mais terna, expressiva, mais ligada consigo mesma. Sinto que o meu lado feminino é melhor para expressar isso. (Caso A-384.)
O destaque é meu e serve para lembrar um aspecto que a Dra. Wambach encontrou em todos os 750 casos estudados e que ela resumiu assim:
- ... nem um só dos meus 750 pacientes sentiu que o eu "verdadeiro eu interior" fosse masculino ou feminino.
A entidade em evolução, movendo-se através de muitas existências "está acima das diferenciações sexuais e deve incorporar ambas as experiências - yin e yang, masculino e feminino – para alcançar um patamar de entendimento mais profundo", conclui a doutora.
- ... são os mesmos os Espíritos que animam os homens e as mulheres - ensinaram os Instrutores de Kardec, ao responder à pergunta número 201. Pouco importa a encarnação num ou noutro sexo, pois...
- O que o guia na escolha são as provas por que haja de passar.
E Kardec acrescenta:
- Os Espíritos encamam como homens ou como mulheres, porque não têm sexo.
Visto que lhes cumpre progredir em tudo, cada sexo, como cada posição social, lhes proporciona provações e deveres especiais e, com isso, ensejo de ganharem experiência. Aquele que só como homem encarnasse só saberia o que sabem os homens.
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E quanto às tarefas programadas para esta vida, o que teriam a dizer aquelas 750 pessoas?
- Senti fortemente que meu propósito nesta vida era o de produzir um grande líder, e que um de meus filhos será esse líder que irá promover mudanças de caráter social. (Caso A-187)
A mulher do Caso 11 disse que estava em débito com algumas pessoas pelo dano que lhes causou no passado, em outras vidas.
- Estou bem consciente agora de que meu marido nesta vida é um alcoólatra e entendo que devo ajuda-lo porque fui cruel com ele numa vida anterior.
Dezoito por cento dos casos examinados colocaram a questão de maneira tão bela que vale assinalar. Não vieram ajustar-se com ninguém especificamente, renasceram "para aprender a amar"...
- Preciso aprender a não me agarrar, possessivamente aos outros - disse o paciente do Caso A-360)
Foram todos unânimes em rejeitar qualquer objetivo de conseguirem riquezas, "status" ou poder. Creio que num grupo maior - 10 mil? 100 mil? - a amostragem indicaria alguns casos em que o Espírito veio com essas motivações mais imediatistas. Isso, porém, não invalida a conclusão da Dra. Wambach, segundo a qual na posição de Espírito, ao elaborar um plano de vida com a assistência de seus guias, a pessoa está basicamente interessada em se recompor perante a lei divina desrespeitada no passado e não de afligir-se na conquista de posições que podem parecer brilhantes entre os encarnados, mas que trazem no bojo inúmeras decepções amargas no futuro.
*
Quanto as ligações anteriores com os parentes, principalmente com os pais, 87 por cento dos casos examinados a confirmaram.
Um desses pacientes (Caso A-381) surpreendeu a doutora, informando que o conhecimento com seus pais vinha, não apenas de vidas anteriores, mas também "do período entre uma vida e outra".
Aliás, a notícia não devia surpreender a brilhante pesquisadora, pois, se o Espírito vive antes de nascer na carne e vive depois de deixá-la pela morte, é claro que vive também uma existência intermediária alhures no universo. A autora acrescenta que não apenas ela foi tomada de surpresa mas os próprios pacientes que não contavam com essa realidade.
E aí está outra observação perfeitamente doutrinária para encerrar o capítulo quinto do livro da Dra. Wambach:
- Todos os meus pacientes contam a mesma história. Retomamos com as mesmas almas, mas em diferentes relacionamentos. Vivemos de novo, não somente com aqueles aos quais amamos, mas com aqueles aos quais odiamos ou tememos. Somente quando sentirmos apenas compaixão e afeição estaremos livres da necessidade de viver repetidamente com os mesmos Espíritos que também são forçados a viver conosco.
Não é notável ler coisas assim num livro de pesquisa moderna que acaba de sair do prelo?
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O que sente o Espírito em relação ao corpo que se forma para ele habitar?
As informações colhidas refletem naturalmente uma grande variedade de experiências e de motivações, vem como de nível evolutivo das entidades reencarnantes.
Alguns se sentem ligados desde o momento da reencarnação. Outros parecem ficar mais "presos" a partir de certo ponto na fecundação. Há os que se julgam ligados numa das várias fases do parto ou até meses depois. A maioria parece gozar de certa liberdade de ir e vir, embora como que "supervisionando" a formação do corpo. Em alguns, a consciência, permanece ativa e lúcida durante todo o processo da gestação e até mesmo semanas ou meses após o nascimento. Em outros, a consciência vai-se apagando lentamente em pontos diversos do processo. Todos têm, não obstante, pelo menos de início, a consciência de que são entidades distintas e separadas do feto.
- Depois do nascimento - disse a pessoa do Caso A-510 - eu ficava com o bebê mais tempo, mas ainda podia deixar o corpo.
São interessantes as reações dos Espíritos às circunstâncias do processo reencarnatório.
- Parece que entrei no feto aos seis meses e lá fiquei, mas intermitentemente. Podia ficar de fora também. Estava consciente de que minha mãe sentia-se irritada e assustada e que continuava desejando livrar-se de mim. Comuniquei-me com ela para deixar-me viver. (Caso A-493. Destaque meu.)
A impressão geral de todas essas informações, segundo a Dra. Wambach, é a de que o nascimento é "um dever e não um prazer".
Vejamos, agora, mais de perto o ato de nascer propriamente dito.
A Dra. Wambach conseguiu que 84 por cento de seus pacientes recordassem com maior ou menor nitidez o traumático processo do parto.
- A coisa mais impressionante nos relatos - escreve ela à página 122 - foi o grau de tristeza experimentado pelo ser ao emergir no mundo.
Mesmo que para muitos de meus pacientes o processo do nascimento em si não tenha sido fisicamente traumatizante, a sensação de tristeza impregnava a experiência.
E mais. Ela observou que...
- Surpreendentes para mim foram os frequentes relatos de que a alma no recém-nascido sente-se desligada, diminuída, sozinha em relação ao estado em que se encontrava entre uma vida e outra.
As reações mais comuns são de desgosto, de desconforto físico e moral, de ressentimento pela falta de amor ou de consideração da parte dos pais, dos médicos ou das enfermeiras.
- Eu sentia que os médicos e as enfermeiras presentes eram impessoais e frios.
Faltava-lhe compassividade pelo temor e pela dor de minha mãe. (Caso A-485.)
- Sinto-me tão triste ao verificar minha solidão e antever uma existência tão dura. (Caso A-452.)
Ante uma dificuldade maior, no momento, um deles perguntou a si mesmo: "De que maneira posso me comunicar com essa gente?" (Caso A-414.)
- Tão logo nasci, tomei ciência do aumento das pessoas que me cercavam, fiquei surpreso ao verificar que minha mãe não me queria. (Caso A-406.)
- Minha impressão era a de que as pessoas ali na sala do hospital não sabiam de nada e que eu sabia tudo. Isto me pareceu comicamente divertido. (Caso B-59.)
- Minha mãe parecia triste e meu pai sentia-se culpado. (Caso A-408.)
- ...Vi que meu Espírito estava observando tudo. Juntei-me ao corpo momentos antes do nascimento. Minha impressão depois do nascimento era a de que a palmada do médico não era necessária. Fiquei indignado. Eu sabia que o médico estava numa tremenda ressaca. (Caso A-365).
São muitos os que teriam preferido ficar "lá dentro", confortavelmente. O mundo exterior era hostil, as pessoas sem amor e sem consideração, os bebês se sentem momentaneamente desamparados, friorentos, impotentes para manifestarem seus pensamentos e terrivelmente Incomodados pela exagerada iluminação do cômodo, pois acabam de deixar o aconchego tépido, confortável, silencioso e escuro do ventre materno. Mal saídos, tudo os agride naquele ambiente novo. Um deles ouviu alguém dizer:
- Que menino gordo! outro percebeu que sua mãe não gostou dele porque era feio. (Caso A-3M.)
Outro percebeu a indiferença do médico que não tinha a menor noção de estar lidando com um ser consciente.
- Tratou-me como se eu não existisse ou fosse uma coisa, um objeto. (Caso A-239.)
Um que experimentou certas dificuldades maiores em atravessar o canal, nasceu, afinal, com dificuldade de respirar. As pessoas presentes achavam que ele não conseguiria sobreviver.
- Eles achavam que eu não viveria e eu queria dizer-lhes que eu o conseguiria. (Caso A-361)
Outro teve a face arranhada pela enfermeira e ficou assustado.
- Eu tinha a inteligência de um adulto - declarou o caso A-23).
- Sentia-me como se tivesse começando um novo curso. Tinha disposição para aprender tudo. (Caso A-185.)
- Eu tinha a compreensão de um adulto, não a de uma criança. Limitava-me a ouvir e observar. (Caso B-105.)
Vários expressaram sua exasperação ao serem praticamente expulsos antes da hora do útero materno.
- No canal do nascimento, certa força insistia em me empurrar. Eu não o podia evitá-lo porque nada havia no que pudesse me segurar ou pendurar. Imediatamente após o nascimento senti um súbito impacto do frio, de luzes brilhantes e aquelas pessoas usando umas roupas engraçadas. (Caso A-20.)
- Senti-me esgotado e irritado. Sentia cruamente a luz, o ar, tudo. Eram tão ásperos. A atmosfera era rude. Eu havia esperado distrair-me, mas era tudo uma comoção e eu ansiava por voltar ao espaço onde tudo era leve. (Caso A-339)
Um deles foi enfático ante as aflições da hora pensou:
- Quero voltar para casa (Caso A-140)
- Eu não gostava daquela ideia de estar espremido naquele pequeno garoto. (Caso A-234.)
- Minha mente - disse outro (Caso A-443) era grande demais para aquele pequeno corpo.
Muitos se queixam do desconforto físico que lhes causa a demora em lavarem seus diminutos corpos.
- Antes de me lavarem, minha pele queimava e repuxava dolorosamente, à medida que o líquido amniótico secava e coçava. Infelizmente, fui lavado por um idiota com uma horrível esponja que me arranhava. (Caso A-348.)
Enquanto isso ele ouvia a mãe a repetir incessantemente: "Não o quero! Não o quero!"
- Depois de haver nascido - diz outro - me senti pesado. A densidade era muita, muito mais do que eu poderia ter imaginado. (Caso A-393.)
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No capítulo oitavo, a autora examina alguns casos de gêmeos, prematuros, crianças nascidas por meio de cesariana e de filhos adotivos.
Num caso muito interessante do ponto de vista doutrinário, um ser espiritual evidentemente mais experimentado convence outro Espírito relutante a renascer e se oferece para nascer junto, como gêmeo. Ao chegar o momento do parto, no entanto, ela percebeu que o irmão gêmeo estava-se desligando do feto. Ele prometeu que não a abandonaria, pois se encontrariam durante o desprendimento do sono para ajudá-la em tudo quanto precisasse. Isto significa, portanto, que ela precisava da reencarnação naquele momento, mas não ele.
Sem dúvida, porém, a Dra. Wambach conclui contra a expectativa de muitos de seus colegas que os gêmeos são animados por Espíritos diferentes.
Curioso também o fato de que somente 14 por cento das crianças adotadas conseguiram lembrar-se ela experiência do nascimento, a despeito do intenso desejo de fazê-lo. São firmes e seguros os mecanismos de proteção espiritual que procuram evitar impactos maiores que iriam desarmonizar as criaturas...
Alguns Espíritos, embora precisando conviver com determinado casal com o qual estavam relacionados anteriormente, tiveram de fazê-lo por vias indiretas, nascendo alhures e sendo posteriormente adotados pelos "pais" escolhidos previamente.
Um desses Espíritos declarou haver escolhido os pais por causa do "material genético de que eles dispunham", mas escolheu os pais adotivos porque eles podiam proporcionar-lhe condições mais adequadas. E assim foi. Houve, porém, um extraordinário incidente. Seria imprevisto? Este Espírito decidira nascer como menino e deixa entrever que já havia combinado tudo com os pais genéticos e os adotivos. Ocorreu, porém, que a mãe engravidou primeiro de uma menina e o Espírito, no açodamento de renascer, apoderou-se do corpo e veio como mulher, o que complicou os seus planos. Coube-lhe, então, "negociar" com os pais adotivos para que desejassem adotar uma menina em lugar de um menino, como aparentemente estava combinado.
*
Naturalmente que tais revelações pessoais - e não há como ignorar-lhes a autenticidade - chocam muitos pacientes e entram em conflito aberto com as suas crenças religiosas ou descrenças da vida de vigília. Muitos se acomodam às novas ideias, após um período maior ou menor de meditação e revisão. Alguns se sentem algo perplexos e desajustados, o que é natural, mas não parece haver casos traumáticos na experiência da Dra. Helen Wambach.
A eminente psicóloga, no entanto, está bem consciente dos riscos envolvidos, jamais forçando irresponsavelmente a revelação indesejada, no que demonstra notável intuição, perfeitamente apoiada pelos conceitos espíritas.
Ela está perfeitamente alertada para o fato de que há experiências traumatizantes no passado que podem emergir de maneira desastrosa na memória atual. Por isso declara: - Acho muito importante entregar o controle dessas recordações existentes na memória ao subconsciente de cada indivíduo. Eu os instruo no sentido de que seus subconscientes bloquearão imediatamente a lembrança de qualquer material perturbador e observo que Isto funciona de fato muito bem.
Ela costuma perguntar se o paciente está preparado para enfrentar as recordações do passado. Quando o sinal é negativo, o assunto fica ali mesmo encerrado.
Essa medida de prudência é altamente recomendável, indispensável mesmo, e está apoiada na melhor ética e nos mais sólidos princípios doutrinários.
É com interessado olho clínico e empatia que ela gosta de observar seus pacientes depois que retornam ao estado consciente. Ficam com o olhar vago a meditarem em silêncio, como se estivessem perplexos ante uma realidade totalmente insuspeitada.
Alguns expressam de maneira poética e com extraordinária sensibilidade a sua atitude, como este por exemplo:
- Era como se eu estivesse deixando um local lindo, brilhantemente iluminado, onde muitas coisas estavam abertas para mim, para descer a um ambiente muito fechado e enigmático. Ao que parece, eu sabia de todas as dificuldades que me aguardavam, e sentia aquele enorme desperdício que nós, humanos, não entendemos.
Não há muito o que acrescentar a esta exposição sobre o excelente trabalho da Dra. Helen Wambach, senão que ela é digna de todo o nosso respeito e gratidão pela força que injetou nos conceitos doutrinários da sobrevivência do Espírito e da reencarnação, para citar apenas dois dos mais importantes aspectos da sua pesquisa. Ainda que o seu livro não traga o impacto de uma novidade para aqueles que já se convenceram desses postulados básicos, suas observações caem como semente vigorosa no solo difícil, mas ávido, da civilização americana há tanto tempo derivando na tormenta materialista que sacode as mais sofisticadas comunidades. Rogamos a Deus que a sua corajosa mensagem possa atrair o maior número possível de irmãos nossos para os quais a chama indecisa da esperança não se apagou de todo.
Hermínio C. Miranda
Revista Reformador - FEB / Maio 1980.
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Recorte do artigo na Revista Reformador Maio 1980. |
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