O irmão que veio da Atlântida (1)
Hermínio C. Miranda
Frequentemente me refiro, em meus escritos, à admirável inteligência dos espíritos com os quais tenho tido oportunidade de dialogar no correr desses anos todos de trabalho junto deles. É sempre fascinante o espetáculo de uma aguda inteligência em pleno funcionamento. Não se trata, contudo, de nenhum privilégio, a presença de tantos companheiros brilhantes em nossas tarefas modestas. O que de fato acontece é que a inteligência não é exceção nos espíritos e sim a norma, a regra geral. Todos eles, ou pelo menos a esmagadora maioria deles, são seres muito vividos e experimentados. Poderão estar momentaneamente bloqueados, tanto na carne como fora dela, mas as suas conquistas estão subjacentes e não é difícil identificar os sinais inequívocos do conhecimento, mesmo que estejam envolvidos num contexto de aparente ignorância e despreparo. Às vezes a situação chega a ser paradoxal: o espírito esconde-se atrás de uma carapaça de ignorância e exiguidade intelectual, precisamente porque já se feriu demais no uso indevido das suas faculdades.
O companheiro de que trata esta narrativa, contudo, não era apenas inteligente - era excepcionalmente brilhante. Esse, aliás, o seu problema, como veremos.
Ele esteve conosco duas vezes. Da primeira, o diálogo foi mais curto. Ele compunha, com mais três companheiros, o grupo que liderava a sua instituição. Viera até nós com um deles e ficara profundamente impressionado com a crise em que mergulhara o seu amigo, ao reviver, pelo processo da regressão da memória, uma horrenda cerimônia de iniciação com sacrifícios humanos que ele oficiara em passado remoto como sacerdote de Moloch (2).
Convencido de que não tinha mais condições de continuar com a tarefa, mesmo porque seu último amigo acabara de "dar aquele vexame", não tinha mais nada a dizer e nem queria ouvir nada. Desejava apenas sair dali o quanto antes para não cair em situação idêntica à do outro. Toda a sua equipe havia sido recolhida ou debandara e ele se confessava com medo de ficar lá, sozinho. Outra coisa importante: não quer saber de nada de seu passado. Já lhe bastam as dificuldades do momento. Não quer nem imaginar o que lhe estaria reservado numa regressão. Está pronto para fazer qualquer coisa, pois a inação o deixa completamente arrasado. É, portanto, daqueles que se movimentam febrilmente, não por convicção no que estão tentando fazer, mas para manterem-se ocupados, esquecidos da penosa realidade interior, ou por outra, em fuga. Declara-se um indivíduo realista. Fizera uma jogada e perdera. O mundo para ele está dividido em duas partes: os que mandam e os que obedecem. No momento, segundo ele, nós estávamos por cima e ele estava ali para obedecer, pois sabia perder também. Na sua opinião, até Deus seria um bom jogador, pois jogava conosco.
Achava que o Cristo fizera um convite apenas. Ninguém era obrigado a segui-lo. Ele, por exemplo, não o seguira porque não lhe convinha, pois os cristãos eram perdedores natos e o próprio Cristo um perdedor: perdeu para Barrabás, para Pilatos e outros.
Às vezes ele se punha a pensar e se perguntava: Por que Deus nos criou para uma vida desta? Para que ele, por exemplo, existiria? O mundo não passava de uma arena, essa luta, que a gente tem de ganhar sempre para não ser esmagado. Qual o objetivo da vida? A criação, a seu ver, era um gesto arbitrário de Deus, pois ele nem fora previamente consultado. Por conseguinte. Deus tinha de tolerá-lo tal como ele era.
Bem que gostaria de ter fé: até mesmo invejava aqueles que a possuíam, mas no seu entender a fé somente é possível para as almas simples: não, obviamente, para ele, com todas as suas sutilezas intelectuais.
O sentimentalismo era, a seu ver, péssimo conselheiro. A pessoa que se deixava dominar pela emoção estava liquidada, como ainda há pouco havíamos presenciado, com o companheiro que o precedera.
Nesse ponto tivemos de interromper nossa conversa, porque o tempo se esgotara. Pedimos - se os nossos companheiros espirituais concordassem e ele quisesse - que ele voltasse em outra oportunidade, a fim de prosseguirmos o debate. Nesse estado de espírito ele se retirara.
Apresentou-se novamente na reunião seguinte. Dizia-se confuso e agoniado, mas não desesperado, pois era frio e mantinha a cabeça no lugar. Nada de lamentações sobre o leite derramado, que nunca podia ser recolhido.
Passara toda aquela semana isolado num cômodo, completamente inativo. Não que estivesse prisioneiro de nossos mentores - as portas estavam abertas e ele sabia que poderia sair se e quando desejasse. Aquela inação, contudo, era-lhe insuportável. Dentro de si, um vazio imenso. Na mente, pensamentos desencontrados que ele temia estarem prejudicando, por indução, seus próprios amigos (já recolhidos pelos nossos benfeitores). Ele era um homem prático e queria agir, fazer qualquer coisa, pois aquela imobilidade o deixava desesperado.
Seu problema continuava sendo o da busca da fé. O que se deve fazer - pergunta ele - para se encontrar a fé? Deus era, para ele, apenas um nome. O Cristo, outro nome...
O doutrinador lhe explica que ele fora deixado sozinho precisamente porque precisava pensar.
Durante aquela semana que pareceu converter-se em vários anos, em conversa com um instrutor espiritual, pediu que lhe fosse dado um exemplo de fé. Queria ver a fé em ação. Levaram-no a ver uma mulher que chorava a agonia de uma ausência. Nada do que tinha era importante, porque lhe faltava a pessoa que, para ela, era a mais importante do mundo. De repente, as lágrimas cessaram e a mulher sorriu. É que à sua visão espiritual se apresentara um quadro em que ela contemplava uma cena futura, na qual se via unida àquele cuja presença lhe estava sendo negada. Ela então compreendeu que aquilo que ela desejava era seu, já estava lá no futuro; era só esperar. Sua fé estava na certeza desse futuro que, no entanto, era somente esperança naquele instante.
O Espírito ficara impressionado, mas não convencido. Tentara no passado acreditar no Cristo, mas fora tudo inútil. Na sua opinião, se Jesus tivesse tanta força e poder como se proclama, os que apelavam para ele não deveriam sofrer. Confia-se nele e ele não socorre! Deus é outra abstração. Não que ele descreia de Deus, pois é evidente que ele existe, mas a ideia de Deus não responde dentro dele.
Em suma: em tudo aquilo só havia uma realidade, uma certeza - fora a passagem inexorável do tempo. Deixar de ser é que seria o ideal. Fora isso, a melhor solução, no momento, era mesmo a de meter-se num corpo (reencarnar-se) para esquecer.
- O meu mal - suspirou a certa altura - foi querer ser grande demais, penetrar nos mistérios da vida. Só os ignorantes podem ter fé.
Por isso, aliás, no seu entender, é que o Cristo pregara, de preferência, aos ignorantes, pois eram ouvintes mais fáceis de convencer. Quando o doutrinador lhe lembra a cena do apedrejamento da adúltera, ele dá a sua interpretação: o Cristo preferira fugir à responsabilidade, não dizendo que sim e nem que não. Ele preferia Maomé, que fora muito mais objetivo e concreto. Por essas razões ele nunca se interessara pelo problema da fé. Limitara-se sempre a aprender o que lhe pudesse ser útil. Para que serve a fé? Sente-se, porém, como um barco sem rumo, depois que a sua instituição ruiu.
Faz uma pausa e prossegue noutro tom mais pessoal, dirigindo-se ao doutrinador. Naquele cômodo em que ficara em recolhimento havia um livro (O Evangelho), que ele não estava desejando abrir. No entanto, ficara ligado durante a semana ao pensamento do doutrinador e este lhe falara com tamanha ternura e tanta fé que ele acabara abrindo o livro duas vezes, aliás, em lições perfeitamente adequadas à sua situação. (É preciso esclarecer que ele abriu exatamente nas passagens que o doutrinador abrira durante a prece e o seu diálogo mental com o querido e transviado companheiro).
- Me ajude - pede ele - a acordar meu coração.
A seguir, uma trágica e dolorosa confissão: durante o tempo que trabalhou junto aos espíritas deu-se bem com muitos deles, que só têm fé na cabeça... Se alguém os interpela sobre certas atitudes, eles respondem cinicamente que isso não tem importância - fica para a próxima encarnação...
Quanto ao amor, não passa de outra palavra sem sentido para ele. Acha mesmo que nunca amou ninguém.
É, pois, extremamente difícil levar algum consolo a este companheiro e muito mais difícil ainda, conseguir instilar um pouco de esperança na crua aridez daquele deserto íntimo; não se vê ali um recanto verde, um ramo de fé, uma florzinha tímida de amor - tudo seco, vazio, árido, mergulhado numa vasta e solitária desolação.
- Acho que nunca amei a ninguém na minha vida - diz ele.
- Ah! não. Desculpe, não posso admitir isso. Estamos respeitando totalmente seu desejo de não fazer uma regressão ao passado. Acho que você precisaria tentar esse recurso - pode até fazer isso com a ajuda dos companheiros aí no mundo espiritual - para saber onde foi que você perdeu o fio da meada; mas que há amores nas suas vidas, é claro que há.
- Você acha que se eu a fizesse, isso poderia me ajudar?
- Acho que sim, meu querido, a fim de você entender o por quê. Você quer sempre saber o por quê das coisas...
- Será que isso é válido?
-Acho que sim.
- Será que eu conseguiria? Tenho muitos bloqueios...
- Você tem que colaborar, tem que ajudar, mas é claro que em algum ponto das suas vidas houve um traumatismo muito grande, um núcleo muito poderoso, muito forte, que você resolveu trancar lá no porão e que está impedindo a visão mais ampla das coisas. A fé é um sentimento espontâneo na criatura. O ser humano mais primitivo tem as suas crenças, a sua fé, num astro, na lua, numa árvore, numa pedra estranha, num totem qualquer. A fé está nas origens do nosso espírito. Você veio de lá dessas origens tanto quanto nós. Então, em algum ponto dessas vidas você se perdeu.
Longa pausa. Ele parece pensar, hesitando, tentando avaliar as opções e medir as possíveis consequências. Sente que o momento é grave. O doutrinador dá-lhe algum tempo para essas especulações e depois prossegue:
- Você naturalmente vem de um passado muito remoto. Nossos espíritos viveram nas selvas, com crenças primitivas que a gente aceitava sem discutir porque não tinha como racionalizá-las. Agora, volvidos tantos séculos, tantos milênios, quando temos condição de racionalizar a fé, você precisava dessa parada, desse silêncio, dessa conversa consigo mesmo para poder colocar um pouco de ordem nos seus pensamentos. É isso que está acontecendo. Não podemos forçar uma decisão rápida e definitiva em você. É um trabalho que você mesmo vai ter que fazer. Mas lembrando-se sempre de que você tem pontos de partida importantíssimos, mesmo na condição atual.
- Engraçado... De repente, você conseguiu me trazer um pouco de tranquilidade. De repente, senti como se... Não sei lhe explicar, mas sinto que nem tudo está perdido.
- Claro que não tem nada perdido, a não ser o tempo que você passou nessa vida de aflições, de angústias.
- Engraçado... Sinto como se estivessem tirando umas escamas de mim, sabe? Como se eu estivesse olhando para um lugar e nada visse ali e, de repente, saiu aquela parede dali. Estou vendo que a minha visão pode ir até lá no fundo. É essa parede que estava me bloqueando tudo. Não é assim. Não estou numa cela fechada; posso ver através da grade; há uma porta aberta... Não sei... é engraçado. É uma sensação de como se estivessem me libertando. Sabe? É como se abrissem um aporta na minha frente e dissessem: "Sai!" Estou me sentindo bem melhor. Como se estivesse até agora respirando um ar viciado. Estou respirando diferente, sabe? Há quanto tempo eu não sabia o que era respirar assim... Oh! você... você é mesmo um irmão, hein? É como se, de repente, eu ganhasse um irmão, ganhasse alguém. Não estou mais sozinho! Eu tenho você! Tenho vocês todos aqui. Não estou mais só!
Enquanto fica a repetir interminavelmente essa frase mágica - "Não estou mais só" - o doutrinador começa a orar e mansamente a prepará-lo para a regressão: as portas estão agora abertas, temos o seu consentimento explícito, está predisposto ao trabalho e, acima de tudo, confia em nós, naqueles em quem acaba de encontrar irmãos. É chegada, portanto, a hora de descermos às profundezas de suas agonias, ao denso e escuro núcleo de suas aflições milenares. Após a prece ele retoma a palavra:
- Estou experimentando uma sensação muito estranha, como se houvesse uma aragem à minha volta.
- Outros seres também estão aí com você?
- Sim! Sim! Vejo muitos... Vejo jovens que me chamam Mestre. Mestre de quê?
- Conhecidos de outras eras...
- Sim, Parecem indianos. Jovens. Não, não, não... Não são indianos. É uma tez avermelhada, estranha... Avermelhada. Vestes estranhas... Olhos muito vivos. Vejo uma cena: como se eles estivessem emergindo de dentro d'água. Todos saem de dentro d'água.
- Estavam à sua espera?
Longa pausa e depois num tom muito admirado:
- Você sabe quem são eles?
- Sei, mas o importante é que eles sabem quem é você. Sim, eles sabem.
- Vamos, então, retomar a partir dali?
- Não... Você sabe quem são eles? Você sabe de onde eles vêm? Da Grande Nação?
- Eu também andei por lá.
Ele vai num crescendo de surpresas.
- Você andou por lá? Você!?... Sim, eles dizem. Por que me chamam Mestre?
- Porque para eles você era e continua sendo um mestre.
- Era sábio.
- O problema é que você intelectualizou tanto a maneira de ver as coisas, que tentou ser tão grande ou maior do que Deus. E foi aí que você se perdeu.
- Me ajuda. Eu tenho receio de dizer um nome. Queria que você o dissesse por mim. Diga-o. Eu preciso ouvir.
- Atlântida.
Como pode o simples enunciado de uma palavra provocar tamanho cataclisma num ser humano? Nosso irmão tremia e gemia em altos brados como se houvesse perdido o fôlego. Foi um custo acalmá-lo. A impressão que nos ficou da sua terrível aflição naqueles momentos era a de que ele vinha se aproximando cautelosamente, pisando terreno inseguro e perigoso. De repente, faltou-lhe o solo e ele foi tragado por aquele abismo insondável de tempo, sem ter onde agarrar-se. Por alguns momentos ele é o próprio tumulto, um ser sem a mínima noção de tempo ou de espaço. Naqueles instantes ali ele é um mero átomo pensante diante do qual acenderam-se todas as luzes do universo imenso, silencioso, a palpitar de vida. O impacto foi esmagador. Parece que ele precisava ser triturado, pulverizado naquele cadinho cósmico para que, do pó, Deus começasse pacientemente a reconstruí-lo. Poucas vezes tenho presenciado cena tão intensamente dramática e densa de significado. Mesmo habituado às profundas emoções que por vários anos testemunhara ali com meus companheiros, aquilo foi demais. O diálogo reduziu-se quase a um mero solilóquio, pois as nossas emoções eram as mesmas, como idênticas seriam as nossas lágrimas.
- Horror! Horror!... gritava ele.
Em seguida, em voz pausada, palavra por palavra, sílaba por sílaba:
- Eu... Eu... sou res-pon-sá-vel. Sou responsável. Não posso fugir agora... Eu tinha o poder da vida e da morte nas minhas mãos! Eu podia prolongar a vida ou podia cortá-la! Eu os iniciava nos mistérios da Ciência, do conhecimento, do domínio... Eu causei muito mal. Mas por que eles me olham com tanta doçura, esses jovens que estão aqui? Por que me olham assim? Por que me chamam Mestre? Eu não sou Mestre...
- Escuta, meu caro. O conhecimento que você trazia naquela ocasião não se perdeu. Está em você, no seu espírito. O que é preciso agora é que, com uma nova ética, você saiba usar esse conhecimento.
- Éramos pequenos deuses. Tínhamos um poder incomensurável nas mãos. Você sabe o que é isso? De repente, é como se meu cérebro se expandisse aqui, agora, e crescesse, crescesse, crescesse... Estive bloqueado todo esse tempo por medo de usar... Ou, talvez, não. Talvez seja a Divindade que me tivesse cortado, para que eu não errasse mais.
- Acredito mais nesta hipótese.
- Eu me reconheço agora! Oh! meu Deus! Onde o orgulho e a vaidade levam um homem! Que vou fazer? Onde eu estive todo esse tempo? Perdido... Perdido. Meu Deus... Meu Deus, que horror! Você tem ideia do tempo?
- Sim, isto aí são uns dez... quinze mil anos, seguramente. Doze, talvez. O importante agora é que você teve acesso a esse conhecimento e provavelmente - é certo isso - o Mundo Espiritual entendeu que você está em condições de prosseguir daí em frente.
- Sim... Mas eu me envergonho diante desses jovens. Meu Deus! o homem não é nada! O homem nada é! Nunca pensei que era um universo inteiro... Mas eu regredi. Eu... Eu esqueci de mim mesmo. Esqueci quem eu era.
- Você esqueceu por uma razão muito sólida: porque precisava esquecer. Senão você talvez não tivesse condições de estar aqui hoje.
- Eu não deveria estar aqui onde estou agora. Meu Deus! que fiz esse tempo todo? Fiquei num vai e vem de vidas e não avancei um milímetro. Não avancei. Você entende?
- É porque você tinha avançado demais intelectualmente e precisava equilibrar as coisas.
- Fiquei parado no mesmo lugar! Só mudando o pé de posição, mas não caminhei. Ou andei em círculos, não sei... Oh!
- Não se deixe paralisar agora. Está tudo entendido? Sua perplexidade é impressionante:
- Isto me causa um tremendo estupor... Eu me envergonho. Não é possível. Não é possível. Diga-me que não é possível ...
- Não, meu querido. É possível, sim. Esse episódio que, no momento, lhe deixa aturdido e perplexo, tem uma importância muito grande na reconstrução do seu espírito daqui para frente. Você descobriu agora - e entendeu - que amores remotíssimos como o desses companheiros que vieram recebê-lo, neste momento, permaneceram intactos através dos séculos, dos milênios. Então, o amor também existe, não é?
- Mas eles avançaram... E, de repente, parece que eu adquiri de novo aquele potencial. Eu lhes leio as mentes e os vejo longe, avançados no tempo.
- Vê você quantos amigos tem?
- E terei que caminhar muito para chegar lá. Mas eu posso caminhar e eu quero caminhar!
- Vá com calma. Agora que você conseguiu vencer os bloqueios que tinha, por favor, não crie outros. O caminho é o das sandálias nos pés, a túnica pobre, o coração aberto.
- Nós não tínhamos deuses, não tínhamos nada; nós éramos... tudo. Éramos a força, a lei, a ciência, o direito, o poder, tudo... E agora reconheço que éramos apenas pó... Pó!
- Mas com os conhecimentos de que você dispõe, a ciência não se perdeu, está no seu espírito... Da mesma forma que você a usou para causar tantos malefícios, tantos desentendimentos, tantas dores, esta mesma Ciência, este mesmo conhecimento poderão ser agora utilizados para reconstruir, para servir, para levantar aquele que caiu, para curar espíritos - almas e corpos.
- De repente estou vendo como que desfilar na minha frente uma série de existências que eu vivi depois daquela. Em todas elas tenho a mesma desilusão, o mesmo pragmatismo, a mesma mente.
- Onde você encontrou o Cristo?
- Acho que nunca encontrei o Cristo... Eu cruzei com ele, mas em verdade nunca o encontrei. Meu amigo! Muito obrigado, muito obrigado... Você acabou de me dar a esperança! Acabou de me dar a fé, porque se este Ser, este Criador é tão poderoso que me guardou esse tempo todo, que me manteve esse tempo todo e que agora, de repente, me faz encontrar-me outra vez, eu que estava perdido, então é porque Ele se preocupa comigo... Então... então é porque Ele se preocupa com o meu destino. Ele poderia ter-me esmagado e não o fez!
- Poderia ter atendido o seu pedido de não ser. Mas o Cristo disse que o Pai deseja que nos salvemos, não que sejamos destruídos.
- Acho que por isso eu tinha tanto medo. Eu não queria confrontar a minha própria impotência. Eu que me julgava tão grande! Interessante! Agora que me vejo tão pequeno, impotente, é como se tivesse tirado um peso de cima de mim.
E num grito incontido:
- Eu sou livre! Não sou mais grande - sou livre! Não tenho o peso do poder em cima de mim. Posso ser pequeno e não me envergonhar. Posso me ajoelhar e pedir e não me envergonhar! Eu sei agora que não posso resolver todos os problemas. Que existe alguém acima de mim!
Num tom manso, já em pranto:
- Alguém a quem eu posso me entregar... oh! estou vendo uma cena agora. É um grande gabinete, um imenso laboratório, com todos os recursos, eu os tenho aqui. Tenho todas as drogas. Tenho todos os equipamentos... Tenho tudo. Há alguém deitado numa mesa operatória. Alguém a quem eu amo muito. Que estou certo de poder salvar-lhe a vida. E uso todos os meus recursos. Hoje mesmo eu já salvei outras vidas com esses recursos, mas não consigo salvar esta vida que me é tão cara!
Chora desatadamente, à medida que se avolumam as emoções que lhe vêm das profundezas do ser.
- Esta vida que é a minha própria vida... ! Sou forte e nada posso!
Como se observa, o Espírito está completamente regredido àquela vida na Atlântida, e mais do que isso, àquele momento culminante da sua existência, quando se julgava capaz de ignorar, e até a desafiar, a divindade. Faz uma pausa. O doutrinador respeita o seu silêncio. Momentos depois ele volta a falar:
- Oh! sim, você estava certo. Eu tenho um amor. Não estou sozinho. Em algum lugar eu tenho esse amor que não pude salvar. Meu Deus! Como é bom dizer, oh, meu Deus!... Mostraste-me naquele dia a tua força, o teu poder e eu, em vez de pedir, ordenei... Eu não te pedi, eu... oh! meus jovens, meus filhos... Oh, meu Deus! Tanto tempo, tantas vidas inúteis... Eu estava correndo de mim mesmo, me escondendo de mim mesmo. Eu tinha medo de me encontrar comigo. Você vê? Estou chorando, como qualquer mortal. Meus Deus, sou gente, sofro, sou uma pessoa. Finalmente, sou uma pessoa... Eu vou com eles. Não tenho ilusões. Sei que não poderei ficar com eles. Conheço o meu fardo, conheço meus erros, conheço a lei. Sempre conheci a lei. Eu usava muitos mecanismos da própria lei canalizados na ciência, mas não tenho medo. Só lamento não ter te encontrado há mais tempo. Alguém que me tivesse ajudado a sair dali. Alguém que não concordasse comigo. Alguém que me mostrasse o caminho. Eu lhe agradeço, meu amigo. Você terá em mim um irmão, um servo fiel... Um servo fiel, para sempre... Ore por mim. Sei que não vou precisar ficar mais naquele quarto. Não vou mais ter medo daquele Evangelho. Por favor, não se esqueça de mim. Ore por mim.
O doutrinador pede-lhe um nome - um qualquer - no qual possa fixar o seu pensamento para ajudá-lo. E ele responde:
- Não, por favor. Perdi-me tanto que não quero agora. Chame-me irmão. Quero esquecer o que fui. Só poderei ter um nome quando me julgar digno dele. Tome um número... qualquer coisa. Quero perder-me na multidão, quero... Oh! meu Deus! Você está certo. Deus é bom. Sinto algo estranho dentro de mim. Uma energia nova, como se uma máquina que estivesse parada, de repente começasse a funcionar. Obrigado a vocês todos. Muito obrigado! Eu vou com eles...
Hermínio C. Miranda do livro:
O exilado e outras histórias que os espíritos contaram
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NOTAS:
1- ATLÂNTIDA.
Desde que Platão escreveu sobre a Atlântida em dois de seus famosos Diálogos ("Timeus" e "Critias") no quarto século antes do Cristo, o lendário Continente Perdido tem inspirado verdadeiras montanhas de livros e publicações. Claro que nessa vasta literatura há muita especulação inútil e não pequena dose de fantasia. Seria difícil, porém, a esta altura, negar sumariamente a existência da Atlântida.O leitor interessado deve procurar, para uma reavaliação, o livro de Charles Berlitz, cujo título original em inglês é The Mystery of Atlantis (O Mistério da Atlântida), edição da Avon Books, New York.Não dá para discutir numa breve nota como esta nem uma parte das inúmeras teorias e especulações sobre a Atlântida, sua localização, sua civilização e as causas do seu desaparecimento.Creio que do consenso das pesquisas feitas e das opiniões emitidas, pode-se destilar o seguinte roteiro básico:A Atlântida foi um continente de proporções razoáveis, localizado no Oceano Atlântico entre a América Central e a do Norte, de um lado, e o Norte da África e a Europa, do outro. Os Açores seriam remanescentes do território submerso que sobreviveu à invasão das águas nos picos mais altos de suas montanhas.Dos milhões de seres que ali viviam muitos teriam emigrado em várias direções: à América Central, onde deram origem ou impulsionaram as civilizações maia e asteca; ao México e ao Sul dos Estados Unidos, onde os Índios Peles Vermelhas lhes seriam descendentes diretos, nos quais se preservou a cor característica dos atlantes. Grupos sobreviventes teriam alcançado também as praias da Espanha, o que explicaria a misteriosa origem dos Bascos, cuja língua, segundo Berlitz - consumado especialista no assunto - não apresenta encaixes que a identifique com nenhuma das falas europeias.Até este ponto apresentamos especulações admissíveis apoiadas em indícios e inferências aceitáveis. Bem mais rica, ainda que proporcionalmente mais especulativa para muitos, é a informação de origem espiritual filtrada por médiuns de variada capacidade e credibilidade.Emmanuel, por exemplo, sempre discreto, refere-se mais de uma vez, em seus escritos, à existência da Atlântida, mas preferiu não expandir o tema.Já Edgar Cayce, o famoso sensitivo americano, deixou nos seus "readings" inúmeras observações que nos permitem reconstituir um pouco da história do continente submerso. De uma cuidadosa colagem das suas frequentes referências, inferimos que a Atlântida teria alcançado elevadíssimo nível tecnológico por meio de fantásticas descobertas científicas. Com isto, desenvolveu-se uma civilização sofisticada, mas desumana, rica de conhecimento e pobre de amor. Uma elite, prodigiosamente bem informada, reuniu em suas mãos um instrumental de poder jamais alcançado antes ou depois.Ao que tudo indica, utilizavam-se eles de três poderosíssimas fontes de energia: a solar, a nuclear e a de um cristal, que se supõe ser o que hoje se conhece pelo nome de laser. Segundo Cayce, foi precisamente uma ruptura no controle dessas ciclópicas formas de energia que teria disparado o cataclisma que, numa única noite, mergulhou a Grande Nação no escuro silêncio do oceano. Cerca de 200 mil anos de civilização ficaram ali sepultados.Cayce previu em 1940 que ai por volta de 1968-69 a Atlântida começaria a ressurgir das profundezas do mar e precisou até o local, nas proximidades da Ilha de Bimini. Realmente, foi ali que apareceram os primeiros sinais de uma perdida civilização submersa. Daí para cá não apenas objetos tem sido resgatados, mas também, nos dias luminosos de mar claro, tem sido avistadas ruinas de vastas construções no leito do oceano: estradas, aquedutos, esboço de edifício e ruas.Cayce nos fala também de espantosos desvios de natureza ética naquela elite poderosa e culta. Donos de uma tecnologia avançadíssima, programavam seres humanos para uma vida sub-humana, para funcionarem como robôs vivos, controlados por dispositivos eletrônicos implantados no cérebro, logo ao nascerem.Ainda segundo o notável sensitivo americano, uma pequena, mas importante minoria que preservara os valores éticos da vida naquela orgia de abusos, foi avisada em tempo (por processos mediúnicos, ao que parece) do cataclisma iminente e emigrou para o Egito, onde ajudaram a desenvolver a fantástica civilização que ali floresceu. É sintomático, aliás, que haja pirâmides no Egito e no México como as havia na Atlântida. Cayce afirmou, ainda, que documentação confirmando essas informações e contendo revelações importantes sobre a Atlântida estaria encerrada numa câmara subterrânea na areia do deserto de Guiza (Gisé) entre a pirâmide de Queops e uma das patas da esfinge.Um pouco mais de pesquisa nas profundezas do oceano e nas areias do Saara e o perfil da Grande Nação, como a chamou o Espírito, estará reconstituído para que ninguém mais possa dizer que a Atlântida foi apenas uma lenda.Quanto ao tempo decorrido, nosso doutrinador arriscou um número entre 12 e 15 mil anos. As melhores estimativas situam o grande cataclisma aí por 8 mil anos antes do Cristo, ou seja, há cerca de 10 mil anos. Por isso, ao olhar para trás no tempo da sua memória, o nosso querido companheiro espiritual sentiu a vertigem dos milênios. E por isso ele perguntou: "Você tem ideia do tempo?". Poderíamos ter respondido com outra pergunta: "Mas que é o tempo?" Alguém ai sabe?.
2 - MOLOCH (ou MOLECH)
- Era uma divindade adorada pelos amonitas e a qual os hebreus da tribo de Judá, nos últimos anos de reinado, sacrificavam seus próprios filhos. Em (2Reis 23:10), a prática é explicitamente condenada, como se pode ver no texto:- O rei profanou o Tofet (espécie de fornalha na qual eram queimadas as vítimas) do vale de Ben-Enom, para que ninguém mais pudesse passar pelo fogo seu filho ou sua filha em honra de Moloch.Em (2Reís 3:27). Moab sacrifica seu filho e herdeiro com a intenção de salvar o reino. Já o sacrifício da filha de Ahaz (2Reis 16:3) pode ter sido um ato isolado de desespero, segundo a Britânica, mas a prática durou muito tempo. Em verdade, o horrendo ritual é muito antigo e estava, naquela época, tão intimamente associado com o culto de Jeová que Jeremias (Eze,23:39) o condena, declarando não ter sido instituído por Deus.O principal centro desse bárbaro ritual era Jerusalém e sua origem pode ter sido canaanita.Embora a Britânica rejeite a procedência babilônica do culto, o autor espiritual J. W. Rochester, em ROMANCE DE UMA RAINHA atribuí tal prática a Tadar, mago babilônico a serviço de Horenseb, Príncipe egípcio ligado à família real dos Tutmés.
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- Para seguirmos corretamente o espiritismo, devemos submeter todas as mensagens mediúnicas ao crivo duplo de Kardec, sendo eles, a razão e a universalidade.
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- Cisão para estudo de acordo com o Art. 46 da Lei de Direitos Autorais - Lei 9610/98 LDA - Lei nº 9.610 de 19 de Fevereiro de 1998.
- Dúvidas e contatos enviar e-mail para: regeneracaodobem@gmail.com
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