A cólera
Gebaldo José de Sousa
Em cidade interiorana, havia um homem que não se irritava, não teimava e não discutia com
ninguém. Sempre encontrava saída cordial, não feria a ninguém, nem se aborrecia com o
próximo. Morava em modesta pensão, onde era admirado e querido. Seus companheiros
combinaram-se entre eles para levá-lo à teima, à irritação ou à discussão. À noite, serviam
saborosa sopa, de que o nosso amigo era apreciador.
Numa delas, a garçonete chegou próximo à sua mesa, pela esquerda, e ele, prontamente, levou
o próprio prato para aquele lado, para lhe facilitar a tarefa.
Ela, ágil, serviu aos que estavam naquela mesa e dali partiu para outras direções.
Ele, calmamente e em silêncio, esperava, quando ela outra vez se aproxima, agora pela direita.
Volta ele a levar o prato para a direção da jovem, que, novamente, se distanciou, ignorando-o.
Após servir aos demais, passa bem rente a ele, acintosamente, com a sopeira fumegante,
exalando saboroso aroma, como quem concluiu a própria tarefa e retorna à cozinha.
Nesse momento, não se ouvia qualquer ruído. Todos espreitavam discretamente, para ver-lhe a
reação.
Educadamente, chama ele a garçonete, que se volta, fingindo impaciência:
- O que o Senhor deseja? - Ao que ele responde, naturalmente:
- A Senhorita não me serviu a sopa. - Novamente ela lhe retruca, agora, para provocá-lo,
desmentindo-o:
- Servi, sim senhor!
Ele olha para ela, olha para o próprio prato
vazio e limpo...
Todos pensam: vai teimar ou
brigar. Suspense e silêncio total. É quando
ele a todos surpreende, ponderando,
afavelmente:
- A Senhorita serviu sim; mas eu aceito mais!
Não teimou, não se irritou, nem discutiu; e
passou pelo teste; além de nos deixar bela
lição de paciência!
A cólera — filha do orgulho — leva-nos a
cometer crimes, a desrespeitar o próximo e
a nós mesmos, pois que envenena nosso
organismo, levando-o às enfermidades.
Quando nos irritamos:
- despendemos mais energia do que
aquela necessária para resolver o
problema que nos trouxe a cólera;
- afastamos aqueles que poderiam nos
ajudar; pois temem aproximar-se e não
serem compreendidos;
- atraímos péssimas companhias
espirituais, cuja presença nos agravará
os males;
- geramos antipatias, onde vamos.
Estaremos sempre com a verdade?
Convêm-nos indagar a nós mesmos;
- revelamos falta de educação, de
respeito ao próximo;
- envenenamos nosso organismo com
toxinas. É como se uma cobra se
mordesse a si mesma;
- agimos como suicidas indiretos, tal
como aquele que fuma, que bebe, que
se excede em qualquer hábito.
A irritação se traduz em falta de cortesia, que
afasta amigos, atrai antipatias e gera maus
fluidos.
"A cortesia é o primeiro passo da caridade.
A gentileza é o princípio do amor. (...)
As melhores oportunidades de cada dia no
mundo pertencem àqueles que melhores se
fazem para quantos lhes rodeiam os passos.
E ninguém se faz melhor, arremessando
pedras de irritação ou espinhos de amargura
na senda dos companheiros."
Nosso estado de humor influencia benéfica ou maleficamente nossa própria saúde e a
daqueles que nos cercam, suportando-nos o
mau humor, ou compartilhando de nossa
alegria de viver. Quando nos irritamos,
derramamos bílis em excesso no estômago,
dificultando a digestão e envenenando todo o
organismo. Quando alimentamos o hábito da
cólera, inútil ingerir medicamentos. Há que
se eliminar a causa.
A cólera — esse torpedo mental — gera
vítimas em graus diversos, além daqueles que
as expressam e alimentam. Muitas delas
pagam preço elevado pelos atos que cometem
sob seu império, sob a forma de remorso, nos
presídios, nos hospitais e nos túmulos, ou
melhor, no Plano Espiritual.
“Não farias explodir uma bomba dentro de
casa, comprometendo a vida daqueles que
mais amas. No entanto, por vezes, não
vacilamos em detonar a dinamite da cólera”.
Muitos se justificam: é o meu temperamento!
Ousamos discordar, afirmando que não é, não:
é falta de educação mesmo!
“O EVANGELHO SEGUNDO O
ESPIRITISMO” assegura-nos:
“O orgulho vos induz a julgar-vos mais do que
sois; (...) a vos considerardes (...) tão acima
dos vossos irmãos, quer em espírito, quer em
posição social (...), que o menor paralelo vos
irrita e aborrece.”
“Compenetrai-vos, pois, de que o homem não
se conserva vicioso, senão porque quer
permanecer vicioso; de que aquele que queira
corrigir-se sempre o pode. De outro modo, não
existiria para o homem a lei do progresso.”
“Em seu frenesi, o homem colérico a tudo se
atira: à natureza bruta, aos objetos
inanimados, quebrando-os porque lhe não
obedecem. Ah! Se nesses momentos
pudesse ele observar-se a sangue-frio, ou teria
medo de si próprio, ou bem ridículo se acharia!
Imagine ele por aí que impressão produzirá
nos outros.”
“Se ponderasse que a cólera a nada remedeia,
que lhe altera a saúde e compromete até a
vida, reconheceria ser ele próprio a sua
primeira vítima. (...) torna infelizes todos que
o cercam. Se tem coração, não lhe será
motivo de remorso fazer que sofram os entes
a quem mais ama? E que pesar moral se,
num acesso de fúria, praticasse um ato que
houvesse de deplorar toda a sua vida!”
A cólera não exclui certas qualidades do
coração, mas impede se faça muito Bem e
pode levar à prática de muito mal.”
Para os animais, há a vacina antirrábica,
para nós, seres humanos, a vacina chama-se
educação.
Um dos primeiros passos para dominá-la é
aprender a amar o próximo, pois a irritação
demonstra falta de amor, de respeito ao
semelhante, seja ele quem for “Longe de vós
toda a amargura, e cólera, e ira, e gritaria, e
blasfêmias, e bem assim toda a malícia.”
Paulo: Efésios 4-31.
“A caridade é paciente; é branda e
benfazeja;(...) não se agasta; nem se azeda
com coisa alguma;(...). Paulo - 1 Cor. 13-4.
“(...) Todo homem, pois, seja pronto para
ouvir, tardio para falar, tardio para se irar.”
Tiago 1-19.
Tanto o Velho quanto o Novo Testamento são
fartos nas lições quanto à cólera, à ira —
revelando-nos que o problema é antigo —
mas em parte alguma há exaltação maior
da virtude que a elimina, quanto na
passagem em que Jesus assim se exprime,
suavemente:
“Bem-aventurados os mansos, porque
herdarão a Terra.” Jesus - Mateus 5.
Nem tão bela e resumida receita de paz,
quanto nesta outra:
“... não se ponha o Sol sobre a vossa ira...”
Paulo: Efésios 4-26.
Para nos educarmos, observemos a própria
conduta; e analisemos nossas reações aos
problemas, além de buscarmos as causas
de nossas irritações e eliminá-las, uma a uma. Sem desculpismos e justificativas.
“Contrariar-se alguém a propósito de bagatelas
e a todos os instantes do dia será baratear os
dons da vida, desperdiçando-os,
de modo inconsequente, sem o mínimo
proveito para si mesmo ou para os outros.”
Nesse aprendizado, importa-nos corrigir o
automatismo das reações desequilibradas,
quando despendemos muita energia
inutilmente, com a cólera.
Direcionar as energias para a solução dos
problemas, sem perda de tempo com irritações
desnecessárias, é o melhor caminho.
O Espírito André Luiz na mensagem “PACIFICAR”,
apresenta belas sínteses, das quais
destacamos algumas muito divulgadas e que
têm modificado a conduta de muita gente:
“Não grite. Converse.Não critique. Auxilie.Não acuse. Ampare.Não se irrite. Sorria.”
Adotemos soluções práticas.
O pneu furou? Troquemos o pneu, sem irritação
inútil. Pneus furam mesmo. O gás se acaba.
É da vida. Alguém nos agrediu?
Aviemos a receita de Jesus: ofereçamos a
outra face.
Silêncio à injúria; ou resposta educada, às
vezes até se desculpando por um mal não praticado.
Não importa. O que vale é a Paz. O
outro compreenderá um dia e aí se emenda.
Para espíritos eternos, é sempre oportuno o
aprendizado. O poeta Raimundo Correia, no
soneto intitulado “MAL SECRETO”,
expressa verdade incontestável: a cólera que
espuma (...) no rosto se estampasse (...) quanta gente, talvez, que inveja agora nos
causa, então piedade nos causasse!”
Grande progresso faríamos nesta
encarnação se, triunfando de nós mesmos,
lográssemos vencer a ira, a cólera, por
ninharias ou mesmo por grandes razões.
Indispensável crescer e superar- se.
Gebaldo José de Souza
Fonte: Revista Informação / Abril 2002
Fonte: Revista Informação / Abril 2002
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
- Emmanuel/Francisco C. Xavier. ESCRÍNIO DE LUZ. 2 ed. Matão: Casa Ed. O Clarim, 1982;
- Emmanuel, Francisco C. Xavier. ENCONTRO MARCADO. ed. Rio de Janeiro: FEB, 1978;
- KARDEC, Allan. O EVANGELHO SEGUNDO O ESPIRITISMO. 82 ed. Rio de Janeiro: FEB, 1981. Cap. 9;
- BÍBLIA SAGRADA, trad. de João Ferreira de Almeida, Soc. Bíblica do Brasil, Brasília (DF), 1969;
- André Luiz/Francisco C. Xavier. ENTRE A TERRA E O CÉU. 6 ed. Rio de Janeiro: FEB, 1978;
- André Luiz/Francisco C. Xavier. RESPOSTAS DA VIDA. 9 ed. São Paulo: IDEAL, 1980, Cap. 27.
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