sábado, 26 de dezembro de 2020

Kojac e o fantasma do Cadillac

Kojac e o fantasma do Cadillac

Hermínio C. Miranda


Em entrevista divulgada em julho/87 pela publicação Speak Up, da Editora Globo, o famoso ator Telly Savalas, criador do detetive Kojak, nas telas, conta ao jornalista Peter Panton um dos mais fantásticos episódios de que eu tenha notícia nestes longos anos de assídua frequência à literatura psíquica. Que me lembre, somente um caso narrado pelo nosso Cornélio Pires, em Coisas do Outro Mundo poderia assemelhar-se. Não, porém, com a mesma riqueza de detalhes ou na inesperada conclusão. 

Os fatos - e fatos a gente tem de aceitar - foram de tal maneira impactantes que, ao narrá-los ao entrevistador, mais de trinta anos depois, Savalas afirma que "mesmo hoje" ainda se sente assustado e que coisas como aquela "não deveriam acontecer com sujeitos como eu", acostumados à ideia de que dois mais dois fazem quatro.

A "coisa" se passou aí pela década de 50, em New York. Curiosamente, foi a época em que lá vivi eu, o escriba destas linhas, e, mais estranho ainda, em região que conheci muito bem, pois era meu caminho de sempre, ao ir à cidade ou de lá regressar, de carro, ao nosso apartamento em Flushing, Long Island, onde, aliás, nasceu nosso filho Gilberto, em 1950. Mas isto é apenas uma vinheta pessoal que acrescento à estranha narrativa do nosso popularíssimo Kojak.

Savalas fora levar em casa uma companheira de incursão pela noite novaiorquina e regressava ao lar, em Long Island, quando seu carro parou na pista por falta de gasolina, o que, segundo ele, não é muito raro acontecer. Isto já alta madrugada. O recurso era descer do veículo e sair a pé, em busca do mais próximo posto de gasolina. Alguém sugeriu-lhe atravessar o pequeno bosque para encurtar caminho. Realmente, as pistas por ali ficam entre gramados e arbustos, em pequenos parques. Daí o nome "parkway", o caminho do parque.

Preparava-se o bravo Savalas para entrar pelo bosque, quando alguém lhe perguntou: "Quer uma carona?"

Quem lhe fazia a pergunta era um sujeito sentado na direção de um imponente Cadillac. O futuro ator olhou bem o indivíduo e teve um momento de hesitação, pois o homem lhe pareceu algo estranho, mas resolveu arriscar-se, mesmo porque não tinha muita escolha, a não ser a de perambular pela região até encontrar um pouco da gasolina salvadora. A curta viagem ao posto foi, no seu dizer "muito agradável". Quando Savalas meteu a mão no bolso para apanhar algum dinheiro, o homem, sem fazer perguntas, disse-lhe: "Vou emprestar-lhe um dólar". Como é que ele sabia que Savalas estava sem dinheiro até para a gasolina? Não havia como recusar a importância oferecida, que dava, àquela época, para um galão do precioso líquido que move o mundo.

Savalas identificou-se como funcionário do State Department, e confessou-se "muito embaraçado", mas que aceitaria o dinheiro, desde que o outro concordasse em considerá-lo simples empréstimo, a ser restituído posteriormente. O outro recusou, mas, ante a insistência, acabou aceitando a proposta. Escreveu seu nome e endereço num pedaço de papel e o passou a Savalas.

Adquirida a gasolina, de regresso ao carro parado na pista, o generoso cavalheiro observou, sem mais aquela: "Eu conheço Fulano". E daí?, pensou Savalas. Quem seria Fulano? O estranho disse que se tratava de um jogador de beisebol do time dos "Red Soxs", de Boston. Savalas, cada vez mais perplexo, concluiu com seus botões que o sujeito do Cadillac era um tanto ou quanto para o doido, ainda que pacífico e aparentemente inofensivo. Seja como for - a essa altura dos acontecimentos eram quatro horas da madrugada - chegaram ao carro parado que, devidamente abastecido, se pôs em movimento, graças à ajuda providencial do homem do Cadillac.

Fora, no todo, uma experiência agradável, afinal de contas, na sumária avaliação de Savalas, ainda que com um inequívoco toque de singularidade. Mas a historinha não estava encerrada. No dia seguinte, quando Savalas saiu à rua para almoçar, leu numa manchete de jornal que o jogador de beisebol mencionado na conversa, morrera, aos 24 anos de idade, "exatamente na hora" em que ele falava com o enigmático indivíduo, naquela madrugada.

Savalas botou no episódio um rótulo cômodo: coincidência e procurou não pensar mais no assunto. A noite, porém, comentou o caso com a sua mãe, uma senhora grega de muita sabedoria.

- Bem, Telly, essas coisas acontecem - observou ela, como se aquilo fosse a coisa mais natural do mundo.

- Você sabe - diz Savalas ao seu entrevistador - minha mãe era uma feiticeira...(Palavra dele, claro, para médium).

Foi quando ele se lembrou do papelzinho com o endereço do seu misterioso salvador no Grand Central Parkway. Para surpresa sua, havia também ali, um número de telefone, além do nome e endereço da pessoa. Savalas discou o número. Alguém atendeu, identificando o local como "Jimmy's Bar" ou coisa semelhante.

- Posso falar com Mr. Cullen? - perguntou Savalas.

- Um momento - foi a resposta.

Em seguida, uma voz de mulher, perguntando o que ele desejava.

- Eu queria falar com Mr. Cullen - repetiu Savalas. Estive com ele a noite passada e ele me disse que eu podia...

- É mesmo? - interrompeu a outra. E como era ele?

Savalas passou a descrever o homem do Cadillac, mas a mulher, do outro lado da linha, começou a chorar, ao mesmo tempo em que dizia:

- Olha aqui, seu bastardo. Não sei bem o que você está tentando fazer, mas você está falando de meu marido e ele morreu há dois anos.

Savalas apresentou suas perplexas desculpas, acrescentando que certamente houvera em tudo aquilo, algum equívoco lamentável.

Mas ainda não era aquele o fim da história. Umas poucas semanas depois, ele foi ao encontro da mulher, pois a coisa era fantástica demais para o seu gosto e ele queria deslindar o enigma. Achou mesmo que alguém estaria tentando divertir-se macabramente à custa da pobre senhora. Acontece que ela confirmou que a roupa que o homem do Cadillac vestia, no encontro com Savalas no "parkway", era a que usara ao ser enterrado seu corpo, dois anos antes. Só não conferia o timbre de voz, que Savalas afirmava ter sido um tanto mais agudo, e que ela insistia em dizer que fora uma voz grossa, como a dele, Savalas. O resto era aquilo mesmo. E mais: o homem se suicidara...

Ao terminar a narrativa, nem Savalas nem o entrevistador têm muito a dizer.

- Meu Deus! - comenta Peter Panton. Você poderia até escrever uma novela sobre isso!

- Bem - diz Savalas. Que acha você disso? Aí está uma coisa que para mim é ridícula.

Com isto, mudou o rumo da conversa e o assunto.

O dramático relato de Telly Savalas nos leva a singulares reflexões. Esta, por exemplo: como são enigmáticos os mecanismos da mente! O famoso ator, criado nas agitadas ruas de Nova York, habituado a abrir espaço para si mesmo onde quer que esteja, dotado de reconhecido talento como ator premiado, passa, na sua excelente entrevista, a imagem de um homem realista e objetivo, tal como o detetive durão que representa nas telas. Confessa honestamente ser do tipo que somente aceita aquilo que for nítido e incontestável, como "dois mais dois, que fazem quatro". No entanto, quando fatos não menos nítidos e incontestáveis demonstram a ele, pessoalmente - e não em segunda mão - que o dois da chamada morte somado ao dois da manifestação póstuma do ser, produzem o quatro da imortalidade, ou, no mínimo, da sobrevivência do ser, ele só tem um comentário perplexo: "Isto não pode acontecer com um sujeito como eu! Ridículo!"

Qualquer outra ciência, doutrina ou vetor do conhecimento humano que dispusesse de tão impressionante acervo de fatos como a realidade espiritual, teria atrás de si e na sua base, um consenso, senão uma sólida unanimidade. Não obstante uma pessoa inteligente, vivida e civilizada, posta irreversivelmente perante o fato vivo, não tem o que dizer senão que lhe parece ridícula a realidade testemunhada. E pensar que essa pessoa, como todos nós, é também um espírito sobrevivível... 

Estranhos, de fato, são os mecanismos da mente no ser encarnado...

Antes de encerrar este pequeno relato, convém relembrar a experiência do nosso Cornélio Pires, conforme ficou referido de início. Infelizmente, tenho de contar o episódio de memória, dado que não consegui localizar meu exemplar de Coisas do Outro Mundo, talvez emprestado com alguém.

Cornélio foi uma figura sensacional. Alegre, jeitão meio caipira, andava pelo interior do Brasil como verdadeiro desbravador, levando a toda parte, sua arte ingênua de humorista, sem palavrões e sem recorrer à pornografia tão em moda hoje. O rádio apenas engatinhava, a TV era ainda um sonho nem sonhado, as estradas de rodagem, meras picadas abertas na solidão de campos e montes, os automóveis raros e importados, postos de gasolina e oficinas ainda mais escassos, espalhados pela vastidão do país. Mesmo assim o bravo Cornélio circulava por aí, num calhambeque já muito sofrido, dirigido por um motorista não menos valente que ele. Era comum ficarem atolados pelas estradas ou de molas quebradas em lugares ermos, sob chuva pesada ou soleira inclemente. Nas cidadezinhas do interior, Cornélio e seu fiel motorista hospedavam-se em modestíssimos hotéis, sempre contando suas histórias, seus "causos", suas piadas e vendendo os livrinhos que escrevia. E sempre de bom humor. Foi um grande sujeito. E espírita convicto. Coisas do Outro Mundo é uma delícia de livro, tão injustamente esquecido, como os demais de autoria do bom Cornélio.

De volta ao mundo espiritual, continuou a escrever seus versos de espontânea ingenuidade e pureza, como este que uma amiga minha psicografou em 17 de julho de 1981: 

Foi aqui na tapera de Nhô Chico
Que o José da casa do Cerrado,
Rapaz de boa fala e muito rico,
Encontrou pousada em seu telhado. 

Andava o rapaz em noite escura
À procura de pouso e algo quente
Já que o baio perdera a andadura
E caíra em brejo repelente...

Nhô Chico, preto velho em abandono,
Deu ao rapaz café, pouso e conversa,
Mas pediu-lhe reza antes do sono.

"Meu fio, neste chão de terra dura,
Ninguém pisa debaixo da coberta
Sem louvar a Jesus em reza pura!"

Numa dessas viagens pelos ermos, o calhambeque resmungou, corcoveou e parou, resfolegante. Vira daqui, vira dali, e nada de a "fubica" pegar e se por em marcha novamente. Foi quando surgiu na estrada, um homem, jeito meio caipira, paletó jogado no braço, conversa fácil e simpática. Quis logo saber do que se tratava, disse que entendia um pouco de mecânica e deu logo com o enguiço, que estaria sendo provocado por uma peça quebrada. "Por acaso", tinha até em seu poder exatamente a peça quebrada que, logo substituída com indiscutível competência, restituiu a saúde à "fubica" do Cornélio. Ante a alegria geral, o querido humorista e escritor voltou-se para agradecer ao providencial "mecânico", mas ele simplesmente desaparecera, como se fosse feito de fumaça...

E a gente ainda acha que sabe algo a respeito desses mistérios que Deus colocou nas coisas que fez... 

Hermínio C. Miranda
Do livro: As mil faces da realidade espiritual

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